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São Paulo, quarta-feira, 12 de fevereiro de 2003

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PALEOBOTÂNICA

Plantas dos oásis do Nordeste há 120 milhões de anos podem esclarecer a origem dos vegetais com frutos

Estudo revela flores mais antigas do Brasil

Tuca Vieira/Folha Imagem
Cientista da USP segura fóssil de pétala de flor (espécie desconhecida) com 120 milhões de anos


REINALDO JOSÉ LOPES
FREE-LANCE PARA A FOLHA

São fragmentos pequenos, pétalas ali, folhas acolá, um fruto que lembra uma vagem. Mesmo assim, esses restos vegetais de 120 milhões de anos pertencem às mais antigas plantas com flores do Brasil e podem ajudar a entender como esse grupo -chamado de angiospermas- passou a dominar o planeta, respondendo por 90% das espécies vegetais.
As flores e frutos primitivos vêm da bacia do Araripe, uma das mais abundantes jazidas de fósseis do Brasil, que se divide entre os Estados do Ceará, de Pernambuco e do Piauí (veja mapa acima, à direita).
A bacia contém restos de inúmeras espécies animais e vegetais do Cretáceo (de 142 milhões a 65,5 milhões de anos atrás), o último período geológico antes da extinção dos dinossauros.
"É quase certo que todos os espécimes que nós temos aqui pertençam a novas espécies, e mesmo a novos gêneros", disse à Folha a paleobotânica Mary Elizabeth Bernardes-de-Oliveira, 57, do IGC (Instituto de Geociências) da USP. "Como estamos estudando um intervalo de tempo grande, de cerca de 10 milhões de anos, é muito raro que dois exemplares da mesma espécie ocorram juntos", afirma a pesquisadora.
Com base em fósseis que pertencem à coleção do IGC, Bernardes-de-Oliveira e seus colegas estão ajudando a entender o momento em que as plantas com flores e frutos ainda estavam engatinhando na evolução. "Na idade que estudamos [o Aptiano, uma subdivisão do Cretáceo", só 20% dos vegetais parecem ter flores."
Estudar os fósseis do Araripe, em especial os da chamada formação Santana, é um dos caminhos ideais para entender a origem das angiospermas. Tudo indica que o grupo surgiu na zona do planeta conhecida como equatorial árida -que inclui exatamente o atual Nordeste brasileiro e a moderna costa oeste da África, que estavam se afastando lentamente no Cretáceo.

Oásis floridos
Os fósseis analisados até agora indicam que, embora fosse realmente árida, a região nordestina não era tão inóspita assim. Grandes lagos permitiam o aparecimento de oásis, e era ali que as primeiras flores costumavam surgir -e, com elas, os primeiros frutos. Tudo isso sugere que essas pioneiras tinham fortes ligações com espécies semi-aquáticas modernas, como as vitórias-régias.
Nessa fase da evolução do grupo, as sementes eram recobertas por uma camada simples de folhas modificadas, formando uma estrutura que lembra uma vagem moderna. A presença de uma membrana fina ligada a algumas sementes sugere que elas fossem "aladas", capazes de pegar carona no vento para se dispersarem.
Os achados do Araripe também apóiam a teoria de que, nas flores primitivas, os órgãos sexuais masculinos e femininos das plantas com flores apareciam combinados -elas teriam, portanto, os dois sexos no mesmo indivíduo.
Por outro lado, a relação íntima entre flores e insetos, que garantem a reprodução da maioria das angiospermas graças à polinização, pode ter começado cedo. "A bacia do Araripe tem uma quantidade imensa de insetos fósseis. A presença das plantas com flores talvez ajude a explicar isso", afirma Bernardes-de-Oliveira.
O grupo deve ir até o Araripe e obter mais fósseis para um estudo completo. E já conta com um reforço de peso: David Dilcher, da Universidade da Flórida, que achou a mais antiga angiosperma, com 140 milhões de anos.


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