São Paulo, segunda-feira, 12 de fevereiro de 2007

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Bagaço pode virar álcool a partir de 2009

Brasil entra na corrida para dominar a quebra química da celulose, o que pode elevar a produção de etanol em até 50%

Segundo pesquisador da Unicamp, país tem situação privilegiada devido ao baixo custo da matéria-prima e ao programa do álcool

EDUARDO GERAQUE
DA REPORTAGEM LOCAL

O Brasil disputa para valer a corrida tecnológica que decidirá quem vai conseguir tirar etanol de celulose. A partir de 2009, o país poderá ter dominado uma via de obtenção da energia contida no bagaço e na palha da cana-de-açúcar, afirma um cientista da Unicamp.
Em tempos de aquecimento global, a obtenção do álcool de celulose -que pode ser obtida até mesmo do papel e de parte do lixo orgânico- tem uma elevada importância estratégica.
"No caso do Brasil, onde há uma situação privilegiada de custo de matéria-prima, existem grandes chances de viabilizar a hidrólise ácida comercialmente de dois a cincos anos" afirmou à Folha Carlos Rossell, do Nipe (Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético) da Unicamp.
Para o especialista, todo o esforço feito nas últimas décadas com o etanol é que coloca o Brasil na posição de liderança. "Hoje, por exemplo, estamos em uma posição mais vantajosa do que os EUA na produção dos biocombustíveis."
A própria visita ao Brasil do presidente George W. Bush, marcada para 9 de março -e cujo principal tema devem ser os biocombustíveis-, sustenta a opinião do pesquisador.
Em São Paulo, representantes do governo americano disseram na semana passada que a pesquisa e o desenvolvimento de biocombustíveis podem ser o "eixo simbólico" de uma parceria "nova e mais forte" entre o Brasil e os Estados Unidos.
Para o Rossell, que também faz consultorias para empresas do setor sucroalcooleiro, o Brasil terá seu próprio modelo de hidrólise da celulose. "Isso não é uma questão de nacionalismo. Teremos um modelo próprio, porque nossas condições são especiais", explica.
Um das dificuldades hoje na fase da hidrólise da celulose é evitar o surgimento de substâncias que depois vão dificultar o processo de fermentação.

Guerra tecnológica
A hidrólise ácida (a quebra da longa molécula de celulose em açúcares por meio de substâncias químicas) é uma das vias que estão sendo estudadas para produzir álcool de celulose.
A outra é a chamada hidrólise enzimática. Por essa via, que imita a natureza, o ataque à celulose é feito por enzimas (grandes biomoléculas).
"A hidrólise enzimática hoje é a que tem o maior potencial de conversão. O problema é que não há enzimas disponíveis capazes de fazer a transformação", explica Rossell.
Segundo o pesquisador, o histórico do processo de produção com a hidrólise ácida é muito mais antigo. "Ele vem desde a 2ª Guerra Mundial. O que se faz agora é tentar adaptar o processo para que essa produção possa ter escala comercial, o que nunca foi feito".
Pelos cálculos de Rossell, a hidrólise poderá ajudar muito o país na sua vontade de produzir etanol, sem ter de aumentar muito a área plantada. O modelo dele emprega como base uma destilaria capaz de produzir de 1 milhão de litros ao dia.
Desde que a geração de resíduos seja otimizada - hoje a palha, por exemplo, é quase toda queimada no campo- haverá 240 toneladas de biomassa celulósica para ser utilizada. Superadas as barreiras tecnológicas, esse total pode ser convertido em quase 500 mil litros de álcool, calcula o cientista.
Apesar dessa aposta na hidrólise ácida, nada deve ser descartado, segundo Rossell. Até mesmo a opção de alguns países da Europa e dos Estados Unidos, que integraram a fase da quebra da celulose no mesmo processo da fermentação (SSF, na sigla em inglês) merece atenção. "Na pesquisa científica, nós temos que aproveitar o que é feito lá fora, e vice-versa", lembra Rossell.


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