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PALEONTOLOGIA
Achado do RS é o primeiro de seu tipo encontrado no país e desafia idéias sobre a origem desses animais
Brasil ganha novo dinossauro ancestral
REINALDO JOSÉ LOPES
ENVIADO ESPECIAL AO RIO
A história para lá de complicada
da origem dos dinossauros deve
ganhar em breve um novo capítulo brasileiro. Trata-se de um animal extremamente primitivo,
herbívoro, que pode se tornar o
primeiro membro de um grupo
que, até então, não tinha fósseis
registrados no país.
Oriundo das rochas da formação Santa Maria, perto do município gaúcho de Agudo, o animal
era um ornitísquio, grande grupo
de dinos comedores de plantas
cujos representantes mais famosos são os estegossauros (os das
placas de osso nas costas) e os chifrudos Triceratops. O bicho do
Rio Grande do Sul, no entanto, é
bem mais antigo: rondou a região
no fim do Período Triássico, há
uns 220 milhões de anos, o que o
coloca na companhia de alguns
dos mais velhos dinossauros.
"Antes disso, aqui no Brasil nós
só tínhamos ocorrências de pegadas desses animais, e mesmo assim muito recentes, do Cretáceo
ou no máximo do fim do Jurássico [ou seja, a partir de 150 milhões
de anos atrás]", conta Max Cardoso Langer, paleontólogo da
USP de Ribeirão Preto que está estudando a provável nova espécie.
Os rastros vinham da Paraíba e
de Araraquara, no interior paulista, mas obviamente não podiam
fornecer quase nenhuma informação sobre os bichos além da
classificação num grupo amplo.
Tudo mudou com o novo fóssil,
apresentado ontem durante o 2º
Congresso Latino-Americano de
Paleontologia de Vertebrados,
que acaba hoje no Rio de Janeiro.
O animal, apesar de muito primitivo (e, portanto, com poucas diferenças marcantes em relação a
outras espécies de dino do período), tem alguns traços que o ligam
definitivamente ao grupo.
Bom de bico
Descrito por Langer em parceria com o paleontólogo Jorge Ferigolo, da Fundação Zoobotânica
do Rio Grande do Sul, o bicho era
um tampinha se comparado aos
representantes mais recentes do
seu grupo: não tinha mais que 1,5
m de comprimento. Os genes da
família, no entanto, são dedurados pela presença, um tanto incipiente ainda, é verdade, do chamado osso pré-dentário. Trata-se
de uma projeção óssea no "queixo" da criatura, sem dentes, ao
contrário do resto da mandíbula.
"O nosso bicho tinha um bico
córneo que era apoiado justamente por essa extremidade banguela", explica Langer. No entanto, o pré-dentário não está tão
bem-formado nos espécimes
gaúchos quanto nos ornitísquios
"clássicos" -o que até seria de
esperar, considerando a idade.
De completo a provável nova
espécie não tem nada: a equipe
achou cacos isolados do maxilar e
da mandíbula, vértebras da cauda, ossos da perna e do quadril,
entre outras coisas. "O pior é que
achamos nada menos que 12 fêmures direitos e nenhum esquerdo. Vai saber o porquê", brinca
Langer. O curioso é que mais dois
fêmures, significativamente
maiores que os 12, também estão
presentes em meio ao material
-possivelmente outra espécie.
Pesquisadores presentes no
evento avaliaram positivamente a
descoberta. "Achei muito interessante. O que ele mostrou pode ser
uma forma de ligar o Lesothosaurus, um dos primeiros ornitísquios conhecidos, mas que já tem
características totalmente definidas, aos dinossauros mais primitivos", diz Oliver Rauhut, do Instituto Estadual de Paleontologia e
Geologia da Baviera (Alemanha).
"Apesar de o material ser fragmentado, ele conseguiu mostrar
que há uma associação próxima
entre os fósseis. O estágio do fóssil poderia realmente estar ligado
à passagem de um estágio de bípede carnívoro [presente nos
mais antigos dinossauros] para o
de bípede herbívoro", avalia Michael Benton, da Universidade de
Bristol, no Reino Unido.
Geografia confusa
O animal ainda não tem nome
científico, mas parece ter parentesco próximo com outro dino
primitivo, o Silesaurus, da Polônia. Sua presença ao lado de outros dinos muito primitivos da
América do Sul, como o Eoraptor,
carnívoro, e o Saturnalia, dos
herbívoros conhecidos como saurópodes, poderia indicar que um
dos centros de origem do grupo
foi mesmo o Brasil e a Argentina.
Mas as coisas nessa seara andam
confusas, para dizer o mínimo.
O congresso, que reúne 300 pesquisadores de todo o mundo, é
organizado pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e
patrocinado pela Petrobras.
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