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Levedura "gay" pode causar doença mais grave, indica estudo
Fungo estudado por americanos é conhecido por provocar infecções em pessoas com sistema imune já enfraquecido
Micróbios conseguem se reproduzir com o mesmo sexo, o que aumenta suas chances de gerar prole mais bem adaptada e agressiva
RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL
Toda forma de sexo vale a pena, se você é um fungo. Por
mais de um século se achou que
o fungo da espécie Candida albicans era assexuado. Depois
viu-se que ele também fazia sexo. E agora três pesquisadores
mostraram que a reprodução
sexuada também pode ocorrer
entre células do mesmo sexo,
uma forma de "homossexualidade", como divulgou a própria
revista "Nature", onde o estudo
está descrito hoje.
Não se trata de mera curiosidade sobre a vida sexual dos
micróbios. Aparentemente, o
modo como fazem sexo e trocam material genético estaria
ligado também à sua virulência
como causadores de doença.
Mais precisamente, essa forma
de reprodução em fungos é
chamada de homotálica.
A Candida albicans é o mais
comum entre os fungos causadores de doença em seres humanos. Ela está presente na
flora microbiana do sistema digestivo da maioria das pessoas,
mas em geral só afeta pessoas
com o sistema de defesa do organismo abalado, como portadores do vírus da Aids ou que
passam por quimioterapia.
"Parece que ambos os modos
de reprodução são possíveis, o
convencional, entre sexos
opostos, e o entre células do
mesmo sexo", disse à Folha o
líder do estudo, Richard Bennett, da Universidade Brown,
nos EUA. Em geral, afirmou, a
reprodução homossexual aumenta a capacidade de sobrevivência da espécie -e, possivelmente, a resistência da cândida
a tratamentos.
O novo estudo foi comentado por outro pioneiro dos estudos da "sexualidade fúngica",
Joseph Heitman, da Universidade Duke, também nos EUA.
O título do artigo de Heitman é
significativo, tirado de uma
música do cantor-compositor
Stephen Stills (do quarteto
Crosby, Stills, Nash and
Young), de 1970: "Love the One
You're With". Como diz o refrão, "Se você não pode estar
com quem você ama, ame
quem está com você".
"Há miríades de formas de
sexo", como lembra Heitman,.
Sexo facilita a evolução biológica ao recombinar o material genético e eliminar mutações nocivas. Na maioria dos animais
isso é feito por meio da combinação de uma célula sexual
masculina com outra feminina.
Já entre fungos não se pode
falar estritamente em "macho"
e "fêmea". O sexo envolve duas
células com forma parecida,
chamadas "a" e "alfa". Cada
uma produz um hormônio sexual, um "feromônio", para
atrair a outra. Alguns fungos
também são autoférteis; um indivíduo isolado pode até fecundar a si mesmo. Essa variedade
reprodutiva "traz para a espécie uma flexibilidade adicional", diz Bennett.
Virulência
Heitman e colegas descobriram o primeiro caso de reprodução com o mesmo sexo em
2005 em outro fungo, o Cryptococcus neoformans. Um virulento surto de doença foi causado na ilha de Vancouver, no
Canadá, por fungos dessa espécie que se reproduziram de
modo homotálico.
A Candida albicans possui
duas cópias do gene ligado à reprodução, "a" e "alpha". Para
fazer sexo, ela precisa perder
um desses genes. "Mas como
isso é raro na população, existe
uma pressão seletiva forte para
fungos isolados serem capazes
de se reproduzir com outros
por meio da reprodução com o
mesmo sexo", afirma Heitman.
"Juntas, as descobertas de
que duas espécies bem divergentes de fungos que infectam
humanos podem ambas se reproduzir unissexualmente sugerem que o processo pode estar ligado à virulência, e é provável que seja ainda mais disseminado do que se imagina hoje", declara Heitman.
O pesquisador acrescenta
que similaridades com os ciclos
sexuais de parasitas como
Leishmania, Giardia e Plasmodium sugerem que a reprodução entre seres do mesmo sexo
"pode ocorrer bem além das
fronteiras do reino fúngico".
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