|
Próximo Texto | Índice
EVOLUÇÃO
Artigo que defende "design inteligente" é aceito para publicação em periódico científico nos EUA, causando protesto
Criacionistas fazem barulho na academia
LAURA NELSON
FREE-LANCE PARA A FOLHA
A guerra entre cientistas e críticos da teoria da evolução foi reacendida depois da publicação de
um artigo num periódico científico norte-americano sobre o chamado "design inteligente", que,
segundo os cientistas, não passa
do velho criacionismo disfarçado.
Esse conflito vem se arrastando
há muito tempo nos EUA, país
em que críticos da teoria do Darwin preferem que uma teoria alternativa -que sugere que os
animais são resultado de um mecanismo inteligente, não do processo cego da seleção natural-
seja ensinada nas escolas.
Os cientistas estão preocupados. Eles acham que o artigo, publicado no dia de 28 de agosto na
revista "Proceedings of the Biological Society of Washington", será
usado para apoiar argumentos
contra a teoria da evolução.
Regra de ouro
O periódico tem poucos leitores
e é considerado de baixíssimo impacto entre as publicações científicas. No entanto, para ser publicado, teve de passar pelo crivo de
três revisores, no processo conhecido como "peer-review" -regra
de ouro para uma publicação
científica. Os três disseram que o
artigo era apropriado.
"Há muito tempo os criacionistas tentam publicar suas idéias em
um periódico com "peer-review'",
diz Eugenie Scott, diretora do
Centro Nacional de Educação
Científica na Califórnia (EUA),
que defende o ensino da evolução
nas escolas americanas.
Scott diz que esse é o primeiro
artigo sobre "design inteligente"
com "peer-review". "Agora, os
defensores do "design inteligente"
vão usar isso como propaganda."
O autor do artigo, Stephen Meyer, é membro do Instituto da
Descoberta, em Seattle, organização que promove -apaixonadamente- a teoria do "design inteligente" e critica a evolução de
Darwin e a seleção natural.
Os críticos do artigo dizem que
não há nenhuma idéia nova nele.
"Quando lemos o artigo, nós o
achamos muito parecido com
coisas que vimos antes", disse
Scott à Folha.
Em resposta ao artigo de Meyer,
cientistas publicaram uma longa
crítica no website "Panda's
Thumb" (www.pandasthumb.org), que apóia a teoria de evolução. A crítica aponta erros, confusões e omissões.
Dois pesos
O Instituto de Descoberta argumentou, na última quarta-feira,
que os evolucionistas diziam que
o "design inteligente" não era
ciência porque periódicos com
"peer-review" não o publicavam.
"As pessoas do Centro Nacional
de Educação Científica parecem
aceitar o "peer-review" quando ele
confirma suas conclusões pré-concebidas" diz John West, diretor-adjunto do Centro para Ciência e Cultura do instituto.
Mas Scott acha que o artigo não
seguiu as regras normais de publicação. Ele não foi, por exemplo,
examinado por um conselho editorial, que é o procedimento regular para publicações científicas.
A Sociedade Biológica de Washington, que tem 250 membros,
admitiu que o artigo não era apropriado para publicação e foi publicado sem o conhecimento do
seu conselho editorial. "Esse assunto [o "design inteligente"] não
será abordado em edições futuras
da "Proceedings'", declarou o
conselho da sociedade.
Mão grande
O editor da revista na época em
que o artigo foi publicado era Richard Sternberg, taxonomista do
Centro Nacional para Informação
Biotecnológica em Maryland
(EUA). Sternberg é também
membro do conselho editorial do
chamado Grupo de Estudo de Baraminologia, que apoia idéias
criacionistas. Sternberg diz que o
artigo foi examinado por três biólogos de "universidades e institutos de pesquisa importantes".
Stephen Meyer não respondeu
aos e-mails da Folha. Mas Rob
Crowther, diretor de comunicação do Centro para Ciência e Cultura do Instituto da Descoberta,
faz questão de distinguir "design
inteligente" de criacionismo.
"Teóricos do design, como o dr.
Meyer, desenvolvem suas teorias
sobre os sistemas vivos com base
em evidência científica", afirma.
Robert Pinnock, um crítico da
teoria do "design inteligente" na
Universidade do Estado de Michigan (EUA), acha que o artigo não
fornece evidências que apóiem a
tese. "O artigo simplesmente diz
que o "design inteligente" está lá. O
artigo não diz como ele explicaria
a ausência da seleção natural."
Próximo Texto: Saiba mais: Para Darwin, evolução é lenta e discreta Índice
|