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EUA forçam impasse na reunião de Bali
País obstrui discussões sobre metas de redução nas emissões de gases-estufa e tenta levar debate para fora da ONU
Ex-vice-presidente Al Gore critica posição americana; Europa e Brasil ameaçam boicotar reunião marcada por Bush para discutir clima
CLAUDIO ANGELO
ENVIADO ESPECIAL A BALI
No mesmo dia em que a Organização Meteorológica Mundial anunciou que a última década foi a mais quente da história (leia texto à dir.), as negociações sobre o futuro do combate
ao aquecimento global chegaram perto do ponto de ebulição. Os EUA lançaram uma
ofensiva para bloquear a tentativa de acordo sobre o "mapa do
caminho" de Bali, o texto que
daria o pontapé inicial no regime pós-Kyoto. O sucesso dessa
manobra pode significar o fracasso do mapa.
Ontem, na COP-13, a conferência do clima das Nações
Unidas em Bali, Indonésia, os
americanos causaram uma crise ao se oporem aos objetivos
de redução de emissões de 25%
a 40% para países industrializados. Estas cifras, produzidas
com base nos relatórios do
IPCC (o painel de climatologistas da ONU), deveriam balizar
o "mapa do caminho". Elas já
haviam sido acordadas em
meados deste ano, pelos Estados Unidos inclusive.
A exclusão das metas, entre
outras coisas que os EUA tentam barrar no acordo, traz o risco de diluir o mapa do caminho,
tornando o tratado que substituirá Kyoto após 2012 incapaz
de produzir a redução de emissões de gases-estufa necessária
para salvar o clima da Terra. A
COP-13 se encerra hoje sob essa ameaça.
Havaí em xeque
A União Européia, que enfrentava a delegação americana
para manter a menção às metas
no texto, se irritou com a armação. Ontem de manhã, o comissário europeu para o Ambiente,
Stavros Dimas, ameaçou boicotar a reunião dos grandes emissores que o presidente George
W. Bush convocou para o começo de 2008 em Honolulu, no
Havaí. Dimas disse à chefe da
delegação americana, Paula
Dobriansky, que "sem um
avanço significativo em Bali essa reunião perde o sentido".
Foi seguido pelo secretário-executivo da Convenção do Clima da ONU, Yvo de Boer. Mesmo evitando criticar os EUA diretamente, De Boer disse à tarde a jornalistas que, uma vez
que o objetivo alegado da reunião de Bush era alimentar o
processo de negociação no âmbito da ONU, o encontro não
teria razão de ser sem um mapa
do caminho sólido resultante
de Bali. "Você não pode alimentar o nada com alguma coisa."
A reunião dos grandes emissores foi a forma encontrada
por Bush -único líder do mundo industrializado a rejeitar o
Protocolo de Kyoto- para esvaziar a Convenção do Clima. A
tática americana tem sido bloquear as decisões importantes
em Bali para forçar a abordagem americana de compromissos voluntários e sem prazo de
redução de emissões.
Pedra no caminho
Só que ontem o tiro de Bush
começou a sair pela culatra.
Além da UE, o Brasil, outro
convidado para o encontro de
Honolulu, também ameaça não
comparecer. "Esse tema de não
comparecer caso se configure
uma atitude obstrucionista dos
EUA em Bali não foi descartado", disse o embaixador extraordinário para Mudança do
Clima, Sergio Serra. "Não abrimos mão do foro multilateral."
A manobra americana vinha
sendo montada desde a semana
passada, quando os EUA se
opuseram à criação de um fundo de adaptação à mudança climática para países pobres.
Na terça-feira, por exemplo,
o país impedira um acordo sobre a redução de emissões por
desmatamento em florestas
tropicais no Terceiro Mundo. O
gesto deixou os negociadores
espantados -os EUA, como se
sabe, não possuem florestas
tropicais. Dobriansky e sua
equipe também tentaram barrar o texto que prevê transferência de tecnologia dos países
desenvolvidos para outros em
desenvolvimento como ajuda
na transição para uma economia livre de carbono.
A questão da transferência
de tecnologia, um dos principais pontos do "mapa do caminho", acabou sendo resolvida
ontem -o que foi comemorado
pelos diplomatas como um
grande avanço de Bali.
Até o fechamento desta edição, os ministros debatiam o
texto do Diálogo para a Implementação da Convenção, que
formará a base do "mapa do caminho". À 1h de sexta (horário
local, 15h de ontem em Brasília), os americanos apresentaram uma proposta de metas voluntárias nacionais, que a UE
considerou "inaceitável". A discussão seguiu pela madrugada.
Visita inconveniente
Ontem, o ex-vice-presidente
dos EUA e Prêmio Nobel da
Paz, Al Gore, também denunciou a atuação da administração Bush para atrapalhar Bali.
Falando para centenas de pessoas num auditório perto da sala onde ministros tentavam resolver o impasse criado pelos
americanos, Gore declarou:
"Eu não estou amarrado por
gentilezas diplomáticas, então
vou contar uma verdade inconveniente: meu próprio país, os
Estados Unidos, é o principal
responsável por obstruir as negociações aqui em Bali". Arrancou aplausos.
Em entrevista coletiva, Dobriansky negou as acusações de
que estivesse sendo uma "pedra no caminho". "Procuramos
maneiras de estender o que está na mesa. Precisamos ter uma
abordagem mais ampla, holística", afirmou, repetindo que os
Estados Unidos querem liderar
o processo rumo ao pós-Kyoto.
"É hora de mostrar liderança
não apenas em palavras, mas
também em ações", alfinetou o
ministro do Meio Ambiente de
Portugal, Humberto Rosa.
Leia mais em "Bali, 40 graus" http://bali40graus.folha.blog.uol.com.br
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