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ENTREVISTA JAMES HANSEN
A crise é a hora de taxar o petróleo e salvar o clima
Climatólogo da Nasa propõe banir o carvão e ataca meta alongada de Obama
Chris Baltimore/ Reuters
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A usina a carvão de Canterville, Geórgia, uma das maiores dos EUA
GUSTAVO FALEIROS
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA EM COPENHAGUE
O físico James Hansen ganhou fama mundial após aparecer no documentário "Uma
Verdade Inconveniente" como
o cientista que alertou o Congresso dos EUA de que o aquecimento global não era ficção.
Seu depoimento de 1988 é considerado um marco que facilitou a criação do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas pela ONU naquele ano.
Hoje, Hansen é um dos cientistas que defendem medidas
drásticas contra o aquecimento, como altas taxas sobre combustíveis fósseis e o banimento
do carvão mineral. Diretor do
Instituto Goddard de Estudos
Espaciais, da Nasa, é responsável por uma revisão anual da
temperatura do globo.
Hansen mostrou que 2008
foi um ano particularmente
frio, mas que isso não significa
que o efeito estufa tenha freado. "Este ano e o próximo provavelmente serão os mais
quentes já registrados", diz.
Em entrevista concedida durante sua passagem pelo Congresso Científico Internacional
de Mudanças Climáticas, na semana passada, em Copenhague, Hansen criticou a proposta de Barack Obama para o novo acordo climático e explicou
por que considera o Protocolo
de Kyoto uma falha.
FOLHA - O sr. tem ganho exposição
na mídia com frases como "usinas
de carvão são fábricas da morte". Isso é uma estratégia deliberada?
JAMES HANSEN - Tento acordar
as pessoas. Podemos usar a metáfora do sapo e da água quente:
se você aquece água numa panela com um sapo dentro, ele se
deixa cozinhar, mas se ele cai
direto em água fervente pula
fora. A humanidade está permitindo cozinhar a si própria. Ela
continua queimando combustíveis fósseis, o que levará a
uma situação sem controle para os nossos filhos e para os
nossos netos.
Eu tinha parado de falar com
a mídia após testemunhar no
Congresso em 1988. Situações
como aquela nos distanciam da
ciência. Não gostei daquilo, não
sou uma pessoa que gosta de falar na mídia. Por 15 anos não
dei nenhuma entrevista em TV.
Mas em 2004, cheguei a uma
conclusão diferente.
Ficou claro que havia uma lacuna entre o que era sabido pela comunidade científica e o
que era entendido pelo público
e pelas autoridades. Outra coisa
que percebi, no contato que tive com a administração Bush
-fui convidado duas vezes a
conversar com o vice-presidente Dick Cheney- era que as
descobertas sobre o clima não
estavam tendo efeito na política ambiental. Aí decidi que precisava falar. Não queria que
meus netos um dia dissessem:
"Meu avó entendeu a gravidade
do problema, mas não conseguiu passar a mensagem".
FOLHA - O ano de 2008 foi especialmente frio, e isso fez com que alguns céticos afirmassem que o
aquecimento global é uma mentira.
Qual o seu palpite para a temperatura destes próximos anos?
HANSEN - Acho que este ano e o
próximo serão provavelmente
os mais quentes já registrados.
Nós estamos entrando em um
período de El Niño. Ele será
mais ameno que o de 1998, mas
agora temos mais carbono na
atmosfera, o que é diferente.
FOLHA - Quão otimista o sr. está de
que será possível alcançar um novo
acordo climático ainda neste ano?
HANSEN - Não estou muito otimista. O que tenho ouvido são
propostas de compensação de
emissões. Se é isso que será feito, prefiro não ver um acordo.
Seria melhor esperar um ano
ou dois. Um acordo como esse
atrasaria medidas por dez anos.
FOLHA - Qual seria a saída, então?
Muitos consideram a próxima reunião de Copenhague, em dezembro,
a última chance de salvar o planeta.
HANSEN - É melhor não ter
acordo do que ter um acordo
ruim. Isso nos levaria de volta à
mesa de negociações no ano
que vem. Claro que eu gostaria
de ver um bom acordo. Mas, a
menos que ele ponha um preço
no carbono e crie um plano para cessar o uso de carvão, não
será suficiente. Espero que o fator principal das negociações
seja encontrar um caminho para estabilizar o sistema climático e evitar desastres. Metas de
redução de emissões no futuro,
sozinhas, não são a melhor maneira de solucionar problema.
FOLHA - O presidente dos EUA, Barack Obama, apresentou uma proposta de reduzir as emissões em
80% até 2050. O que o sr. acha?
HANSEN - Metas de longo prazo
são fáceis, porque as autoridades já estarão fora de seus cargos. Não concordo com metas
porque isso permite uma "lavagem verde". As pessoas podem
fingir que são verdes estabelecendo metas ambiciosas, mesmo quando elas não tomam os
passos iniciais para alcançá-las.
O que é necessário é colocar
preço nas emissões de carbono.
FOLHA - O sr. considera o sistema
de créditos de carbono um erro?
HANSEN - Veja o caso do Protocolo de Kyoto. Países que assumiram metas mais difíceis e as
cumpriram, como o Japão, aumentaram suas emissões e o
consumo de carvão. Como?
Eles compensaram suas emissões investindo na China argumentando que baixariam as
emissões lá. Mas as emissões
chinesas não caíram. Subiram.
Kyoto não é efetivo e levou dez
anos para ser negociado. Precisamos de algo mais simples.
Se EUA e China concordassem em taxar o carbono, o resto
do mundo os seguiria, porque
logo os produtos carregariam
em seus preços o custo do carbono. A maior razão pela qual
continuamos usando combustíveis fósseis é porque são mais
baratos que os concorrentes.
FOLHA - O sr. concorda com a visão
que está em negociação na ONU de
que 2015 deverá ser o momento em
que as emissões globais de carbono
devem atingir o seu pico?
HANSEN - Prefiro acreditar que
o pico das emissões tenha sido
2007 ou 2008, porque agora é
provável que as emissões
caiam. Deveríamos ver a crise
econômica como uma oportunidade de usar a energia de forma mais eficiente e começar a
introduzir as energias alternativas. Esse é o momento onde
podemos taxar o carbono, porque os combustíveis fósseis estão baratos. Isso é o que precisamos fazer para retornar às
concentrações de gases de efeito estufa como as do século 20.
Precisaremos fechar todas as
usinas a carvão nos próximos
20 anos. Isso é 80% da solução
e fará com que as curvas de
emissão caiam muito rápido.
FOLHA - Isso permitiria que a temperatura subisse menos de 2C, como muitos cientistas têm pedido?
HANSEN - Poderíamos ter uma
aumento na temperatura global de 1,7C. Mas com isso nós
já perderíamos todo o gelo no
oceano Ártico. Perderíamos todos os glaciares de montanhas,
que fornecem água para milhões de pessoas.
FOLHA - A energia nuclear deve ser
parte da solução?
HANSEN - Devemos ter a mente
aberta com relação a isso. As
prioridades devem ser a eficiência energética e, depois, as
energias renováveis. É preciso
ainda melhorar as redes de
transmissão, para que se possa
mover a energia para lugares
que não têm como obter as renováveis. Se essas três coisas
não forem possíveis, a energia
nuclear segura é mais vantajosa. Também devemos pesquisar tecnologia de sequestro de
carbono. É difícil, porém, acreditar que o armazenamento de
carbono acabaria com todos os
problemas do carvão. Deverão
existir mais vantagens na quarta geração de usinas nucleares,
mas ainda é preciso provar isso.
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