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Só corte total de CO2 cura clima pós-2100
Eliminação de 60% das emissões humanas de gases estufa até 2050 evitaria aquecimento "perigoso" apenas neste século
Projeção foi feita com novo programa de computador para simular clima global; modelos anteriores não incluíam dados de oceanos
RAFAEL GARCIA
DA REPORTAGEM LOCAL
Se a humanidade quiser uma
solução duradoura para o problema do aquecimento global,
será preciso cortar em 100% a
emissão de gases do efeito estufa provenientes de atividades
humanas. Este é o recado de
um grupo de pesquisadores da
Universidade de Victoria (Canadá) que vem fazendo projeções sobre o futuro da Terra
usando um novo modelo -programa de computador- para
simular o clima mundial.
Em estudo publicado na edição atual da revista "Geophysical Research Letters" (www.agu.org/journals/gl), o grupo
de pesquisadores, liderado pelo
climatologista Andrew Weaver, mostrou a conta que a humanidade terá de pagar para
frear o aquecimento da Terra.
É necessário um corte de
60% nas emissões de gases-estufa até 2050 para evitar que
até o fim deste século a Terra
aqueça mais de 2C além do
normal -nível considerado
"perigoso" por cientistas. Contudo, mesmo essa redução seria incapaz de frear o aumento
da temperatura no longo prazo,
e dentro de cerca de mais um
século o limite seria rompido.
(O acréscimo de 2C é calculado em relação à temperatura
média da Terra no século 19
antes da Revolução Industrial.)
Os novos números saíram de
um dos primeiros modelos climáticos a levar em conta a interação dos oceanos com o dióxido de carbono (CO2) o principal
gás causador do efeito estufa.
"O que nossos experimentos
trazem de novo é que a gente
está simulando carbono ao
mesmo tempo em que simula o
clima", explica Álvaro Montenegro, oceanógrafo brasileiro
do grupo de Weaver que também assina o artigo sobre os
cortes de emissões. "As concentrações de CO2 na atmosfera são dependentes da circulação oceânica, da biota marinha
e da biota terrestre. Todos esses reservatórios de carbono do
planeta respondem ao clima, e
isso é considerado no nosso
modelo e em outros novos."
Montenegro -paulista que
trabalhou na Folha como repórter de ciência entre sua graduação e sua pós em oceanografia- explica qual é a vantagem do modelo do grupo de
Victoria, que não ficou pronto a
tempo de ser incorporado pelo
último relatório do IPCC (Painel Intergovernamental sobre
Mudança Climática). "A gente
não precisa mais estabelecer de
antemão quanto CO2 vai estar
na atmosfera; podemos simplesmente estabelecer quanto
CO2 a gente joga na atmosfera."
O resto, o computador calcula.
Perigo arbitrário
Apesar de já estar encontrando consenso entre cientistas, o
rótulo de "perigoso" dado ao limite de aumento de 2C na
temperatura ainda é arbitrário.
A mudança do clima é gradual e
não é possível saber se vai haver
uma quebra de continuidade
além desse limite, mas, de qualquer forma, a situação já estará
bem ruim a partir desse ponto.
"Passando dos 2C, o risco de
perder a calota de gelo da Groenlândia cresce muito, e isso
apressaria a elevação do nível
do mar", diz Montenegro.
Por fim, Weaver e seus colegas confirmam o que já se sabia
sobre o "inócuo" Protocolo de
Kyoto -o acordo internacional
para corte na emissão de gases-estufa que prevê uma redução
de apenas 5% em relação aos
níveis emitidos em 1990.
"Nada é totalmente inócuo:
qualquer redução nas emissões
de carbono vai acarretar em um
menor aquecimento", diz Montenegro. "Mas o Protocolo de
Kyoto é inócuo se a gente considerar que o aumento de 2C é
um limite importante."
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