São Paulo, domingo, 17 de janeiro de 2010

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Pesquisa refuta colapso ecológico de cidade maia

Decadência de Copán no séc. 8º não foi culpa de desmatamento, diz arqueóloga

História vegetal de floresta em torno de ruínas mostra que mata era densa quando grande centro dos maias em Honduras foi abandonado


Adalberto Vega/CC
Ruínas em Copán

REINALDO JOSÉ LOPES
DA REPORTAGEM LOCAL

O estudo de grandes civilizações desaparecidas tem sido dominado há tempos pelas chamadas "cautionary tales" (histórias para inspirar cautela), as lições moralizantes que podem ser extraídas do fim de grandes impérios. Uma das mais famosas delas, no entanto, está sofrendo uma revisão radical. Segundo um novo estudo, a poderosa cidade maia de Copán, em Honduras, não entrou em colapso por causa da destruição de suas florestas. Pelo contrário: nos séculos que antecederam o fim de Copán, as matas da vizinhança parecem ter crescido, e não diminuído.
A pesquisa, que representa um golpe na ideia de que os maias se autodestruíram por falta de consciência ambiental, está numa edição recente da revista científica "PNAS". Cameron McNeil, arqueóloga da Universidade da Cidade de Nova York e coordenadora do estudo, resume suas conclusões sobre o trabalho em Copán. "Os maias desmatavam? Claro. Eles exploraram tanto seu ambiente que isso acabou solapando o sucesso de sua sociedade? Na maioria dos locais, não."
Construtores de pirâmides, praticantes de uma espécie de "basquete" e autores de belas esculturas, os maias ganharam uma imagem pública de senhores da motosserra (muito antes que a motosserra fosse inventada) graças principalmente ao biogeógrafo americano Jared Diamond, da Universidade da Califórnia em Los Angeles.
Em seu best-seller "Colapso", lançado em 2005, Diamond tenta explicar como grandes civilizações podem ir para o buraco. Baseando-se em pesquisas feitas anos 1980, ele argumentou que o crescimento populacional teria feito os maias desmatarem demais seus territórios, promovendo erosão, esterilidade do solo, fome e guerra. Com isso, os principais centros populacionais no sul do território maia teriam sido abandonados entre os anos 790 e 950 da Era Cristã.

Sutilezas do pólen
Desse último dado ninguém duvida. O problema é que Copán, local de onde vieram os principais indícios que sugeriam desmatamento descontrolado, aparentemente tem uma cronologia bem mais complicada do que cientistas costumavam imaginar. A culpa, mais precisamente, é do pólen, usado por arqueólogos para enxergar o passado botânico.
Armazenados em ritmo regular no fundo de lagos, grãos de pólen indicam com alta precisão as espécies de plantas que vão se sucedendo numa região ao longo do tempo. Acontece que a associação entre o colapso urbano em Copán e o desmatamento se baseia em camadas de pólen de plantas herbáceas (diferentes, portanto, do pólen de floresta) cujas datas mais antigas são do ano 1010.
Antes, acreditava-se que o fim da cidade só teria acontecido para valer no séc. 13 -o suficiente, portanto, para que o desmatamento fosse considerado a causa. No entanto, com o aperfeiçoamento das técnicas de datação fez a estimativa ser alterada para o fim do séc. 9º. E a análise de novas amostras de pólen de Copán, estudadas por McNeil, contam história diferente da narrada por Diamond.
Em resumo, o vale de Copán teve duas grandes ondas de desmate, uma em torno de 900 a.C. e outra por volta de 400 d.C. -nenhuma próxima ao declínio de Copán. Pelo contrário: a cobertura florestal cresceu depois de ficar em torno de 45% do total do pólen em 400 d.C. Do ano 750 em diante, o pólen de árvores corresponde a até 71% do conjunto.
McNeil, que está revisando estudos sobre outras cidades maias, afirma que o quadro não é muito diferente em outros lugares. "Há sinais de degradação ambiental em algumas cidades da região do Petén", diz. "Muitas áreas não passaram por isso no período Clássico [aquele que antecedeu o colapso]."


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