São Paulo, sexta-feira, 17 de agosto de 2007

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Estudo revê colapso da corrente do Golfo

Medo de que o aquecimento global "desligue" o fluxo oceânico que leva calor à Europa pode ser exagerado, diz análise

Circulação das águas do Atlântico Norte sofre uma grande variação sazonal, e não é possível distinguir efeito do clima sobre ela

Stuart Cunningham e Torsten Kanzow
Grupo instala bóia com equipamento de medição nas Bahamas


DA REPORTAGEM LOCAL

Um efeito bizarro do aquecimento global que ameaça criar uma "era do gelo regional" na Europa pode não ser uma ameaça tão grande quanto se pensava, indica um novo estudo. Uma série de medições feitas sobre a corrente oceânica que leva águas quentes do Atlântico tropical à costa da Europa mostra que seu fluxo pode não estar desacelerando, como temiam climatologistas.
Para quem não se lembra, o problema é relatado no filme-catástrofe "O Dia Depois de Amanhã" (2004), que mostra todo o hemisfério Norte mergulhando no gelo com o desligamento daquela corrente. O efeito também é citado no documentário "Uma Verdade Inconveniente". Mas um grupo de pesquisadores que instalou uma grande rede de equipamentos de medição ao longo do Atlântico Norte diz que o fenômeno é mais complexo. Segundo os cientistas, a variação sazonal de temperatura, pressão e outros parâmetros da chamada "corrente do Golfo" é maior do que se pensava. O fluxo da corrente pode diminuir ou aumentar em até 8 vezes durante um ano, diz o novo estudo.
Isso põe em questão vários estudos que se baseavam em medições esparsas sobre o que está acontecendo com as águas que vão do Caribe ao Ártico. Essa é a corrente que, depois de resfriada, desce ao fundo do oceano, por onde retorna para o sul (veja ilustração abaixo).
O problema é que, como os dados coletados até hoje são poucos, uma variação sazonal pode induzir os cientistas a pensarem que ela é uma mudança de longo prazo impulsionada pelo aquecimento global.
Os novos dados trazem mais dúvidas do que certezas e não são um álibi para eximir a crise do clima da culpa por qualquer alteração oceânica. "Acho que é muito cedo para dizer", afirma Stuart Cunningham, do Centro Nacional de Oceanografia do Reino Unido, instituição que liderou um dos dois estudos sobre o problema publicados hoje na revista "Science". "Basicamente, as observações anteriores eram estimativas instantâneas, e há muita incerteza associada à interpretação delas."

Rendido aos fatos
Stuart e dois de seus colegas que co-assinam os dois estudos talvez sejam o mais "prejudicados" pela descoberta de que a dinâmica das correntes do Atlântico é mais complicada do que se imaginava. Eles foram autores também de um trabalho de 2005 na revista "Nature" que apontou a desaceleração da corrente do Golfo. Agora o britânico revê a própria pesquisa.
Os dados usados no novo estudo, coletados entre as Bahamas e a África, incluem temperatura, pressão e salinidade da corrente. Tudo foi feito sem interrupção entre março de 2003 e maio de 2004. Os ventos, que influenciam o fluxo de superfície, também foram analisados.
Ainda assim, a informação é pouca para tirar uma conclusão sobre o efeito da mudança climática na circulação oceânica. Acentuando a dúvida, há simulações de computador sobre o futuro do clima que apontam o colapso da corrente do Golfo.
"Fundamentalmente, precisamos de séries de dados mais longas sobre a alternância [da corrente] para definir sua variação entre os anos", escrevem Cunningham e colegas. "Dez anos de medidas ininterruptas poderiam garantir que quaisquer ciclos sazonais sejam bem definidos e separados da natureza de variações interanuais, sejam elas oscilações, tendências ou mudanças súbitas."
Os aparelhos instalados no Atlântico, prometem os britânicos, ficam ligados até 2014.


Com Reuters


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