|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ANÁLISE
Os limites do "Brasil Grande"
CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA
Do presidente Luiz Inácio
Lula da Silva no sábado, a propósito da iminente conferência
do clima em Copenhague:
"Não temos o direito de permitir que o presidente Barack
Obama e o presidente Hu Jintao [da China] façam um acordo com base apenas nas duas
realidades políticas e econômicas dos seus países".
Da manchete de segunda-feira do jornal espanhol "El País"
sobre o mesmíssimo tema:
"Estados Unidos e China
pactuam liquidar a cúpula do
clima de Copenhague".
Óbvia alusão ao fato de que, à
margem da cúpula da Apec (sigla em inglês para Cooperação
Econômica Ásia-Pacífico), Hu
Jintao e Barack Obama decidiram que Copenhague seria apenas uma boa discussão conceitual, sem decisões concretas.
Pena que seja esse infausto
acontecimento o responsável
por lembrar os limites do "Brasil Grande", da potência emergente cantada em prosa e verso
nos últimos tempos. O limite é
nítido, para quem queira ver
sem se deixar enganar pela máquina oficial de propaganda: o
Brasil deixou, sim, de ser vira-lata, mas ainda está muito longe de virar um cachorro grande
na cena internacional.
Cruel ironia presente em toda essa história: o aviso surge
no momento e no assunto em
que o Brasil poderia, sim, desempenhar um papel de liderança construtiva.
Limpa
A matriz energética brasileira é a mais limpa do planeta, as
metas anunciadas pelo governo
para Copenhague são moderadamente ambiciosas no cenário global, e o desmatamento
está diminuindo (muito menos
do que o necessário, mas diminuindo de todo modo).
Pena que o Brasil tenha demorado demais tanto para definir suas metas quanto para se
desvincular da China.
Às margens do G8 de L'Aquila, na Itália, em julho, reuniram-se os cinco países emergentes que têm sido convidados para a cúpula do mundo rico, entre eles Brasil e China. Na
declaração final, ficou impresso o espírito que, traduzido livremente, diz o seguinte: os
países ricos sujaram o mundo
para se desenvolver e agora
querem impedir o desenvolvimento dos emergentes, exigindo que poluam menos.
Podem até ter razão moral no
raciocínio, mas pensar assim
não resolve o problema do
aquecimento global para o qual
todos contribuem -e os emergentes estão contribuindo cada
vez mais. Só quatro meses depois, Lula se desvencilhou do
apoio à China.
Não quer dizer que, se o tivesse feito antes, a China teria
mudado de posição. De novo, o
Brasil não é cachorro grande o
suficiente para influenciar chineses (ou americanos, ou quem
quer seja nesse jogo).
Mas, ao menos, não daria aos
chineses essa espécie de habeas-corpus preventivo para
evitar se comprometer com
metas ambientais decentes.
Agora, aguada de vez a já
cambaleante cúpula de Copenhague, o mais importante é
salvar os móveis do incêndio. E
o grande patrimônio a salvar é o
acordo alcançado também em
L'Aquila, na reunião das chamadas Grandes Economias (17
países), pelo qual elas (que são
também responsáveis por quase toda a emissão de gases) se
comprometem a não permitir o
aumento da temperatura terrestre acima do limite de segurança de 2 C.
Se as negociações para Copenhague fracassaram em achar
os caminhos para cumprir esse
compromisso, que ele pelo menos fique gravado a fogo no encontro de dezembro.
Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Líderes discutem tamanho do atraso no acordo Índice
|