São Paulo, terça-feira, 17 de novembro de 2009

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ANÁLISE

Os limites do "Brasil Grande"

CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA

Do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no sábado, a propósito da iminente conferência do clima em Copenhague:
"Não temos o direito de permitir que o presidente Barack Obama e o presidente Hu Jintao [da China] façam um acordo com base apenas nas duas realidades políticas e econômicas dos seus países".
Da manchete de segunda-feira do jornal espanhol "El País" sobre o mesmíssimo tema:
"Estados Unidos e China pactuam liquidar a cúpula do clima de Copenhague".
Óbvia alusão ao fato de que, à margem da cúpula da Apec (sigla em inglês para Cooperação Econômica Ásia-Pacífico), Hu Jintao e Barack Obama decidiram que Copenhague seria apenas uma boa discussão conceitual, sem decisões concretas.
Pena que seja esse infausto acontecimento o responsável por lembrar os limites do "Brasil Grande", da potência emergente cantada em prosa e verso nos últimos tempos. O limite é nítido, para quem queira ver sem se deixar enganar pela máquina oficial de propaganda: o Brasil deixou, sim, de ser vira-lata, mas ainda está muito longe de virar um cachorro grande na cena internacional.
Cruel ironia presente em toda essa história: o aviso surge no momento e no assunto em que o Brasil poderia, sim, desempenhar um papel de liderança construtiva.

Limpa
A matriz energética brasileira é a mais limpa do planeta, as metas anunciadas pelo governo para Copenhague são moderadamente ambiciosas no cenário global, e o desmatamento está diminuindo (muito menos do que o necessário, mas diminuindo de todo modo).
Pena que o Brasil tenha demorado demais tanto para definir suas metas quanto para se desvincular da China.
Às margens do G8 de L'Aquila, na Itália, em julho, reuniram-se os cinco países emergentes que têm sido convidados para a cúpula do mundo rico, entre eles Brasil e China. Na declaração final, ficou impresso o espírito que, traduzido livremente, diz o seguinte: os países ricos sujaram o mundo para se desenvolver e agora querem impedir o desenvolvimento dos emergentes, exigindo que poluam menos.
Podem até ter razão moral no raciocínio, mas pensar assim não resolve o problema do aquecimento global para o qual todos contribuem -e os emergentes estão contribuindo cada vez mais. Só quatro meses depois, Lula se desvencilhou do apoio à China.
Não quer dizer que, se o tivesse feito antes, a China teria mudado de posição. De novo, o Brasil não é cachorro grande o suficiente para influenciar chineses (ou americanos, ou quem quer seja nesse jogo).
Mas, ao menos, não daria aos chineses essa espécie de habeas-corpus preventivo para evitar se comprometer com metas ambientais decentes.
Agora, aguada de vez a já cambaleante cúpula de Copenhague, o mais importante é salvar os móveis do incêndio. E o grande patrimônio a salvar é o acordo alcançado também em L'Aquila, na reunião das chamadas Grandes Economias (17 países), pelo qual elas (que são também responsáveis por quase toda a emissão de gases) se comprometem a não permitir o aumento da temperatura terrestre acima do limite de segurança de 2 C.
Se as negociações para Copenhague fracassaram em achar os caminhos para cumprir esse compromisso, que ele pelo menos fique gravado a fogo no encontro de dezembro.


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