São Paulo, quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

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COPENHAGUE 2009

Sem acordo, negociadores paralisam cúpula do clima

Dinamarqueses propõem dois novos textos, que são mal recebidos na conferência

Emergentes avaliam que nova proposta, elaborada por pequeno grupo, é pouco democrática e oferece concessões demais aos EUA


Fil Kaler/Associated Press
Policiais dinamarqueses repelem ativistas que protestam do lado de fora do Bella Center, onde acontece o encontro do clima

CLAUDIO ANGELO
LUCIANA COELHO
MARTA SALOMON
ENVIADOS ESPECIAIS A COPENHAGUE

A conferência do clima explodiu e implodiu ao mesmo tempo ontem, no primeiro dia de discursos dos chefes de Estado em Copenhague. Lá fora, sob neve e um frio de -1C, ao menos mil manifestantes confrontaram a polícia -230 foram presos. Lá dentro, esforços diplomáticos para produzir um acordo acabavam de ruir. Em vez de avançar, a negociação retrocedeu.
Mesmo reunidos noite adentro até 7h de ontem para fechar os textos de acordo que seriam levados à decisão dos ministros, os negociadores dos 193 países não chegaram a consenso -com apenas mais dois dias de reunião pela frente.
"Este é o fim do jogo, em vários sentidos", declarou ontem na plenária Mohamed Nasheed, presidente das Maldivas, país-ilha ameaçado pelo aquecimento global. "Nós deveríamos celebrar o progresso feito até agora, mas (...) podemos não ter um texto acordado em Copenhague", prosseguiu.
O texto final do LCA, o grupo que negocia o novo tratado do clima, foi considerado pela presidente da COP-15, Connie Hedegaard, impossível de ser submetido à decisão, por excesso de pontos de conflito. O do Protocolo de Kyoto, que estabelece as metas de redução de emissões dos países desenvolvidos, não continha justamente isso: as metas a serem seguidas.
Hedegaard ficou de apresentar aos países uma proposta de dois novos textos, mais enxutos. E foi aí que a crise que vinha se gestando desde o início das negociações "explodiu", nas palavras de uma diplomata. Muitos países denunciaram o texto dinamarquês como golpe. Um negociador latino-americano disse que o texto do LCA proposto pela Dinamarca faz concessões excessivas aos Estados Unidos.
Um ponto criticado foi a chamada "comparabilidade" dos esforços de redução de emissões dos EUA. Segundo o conjunto de regras que forma a base para a negociação de Copenhague, o Plano de Ação de Bali, os países desenvolvidos que não são partes do Protocolo de Kyoto (ou seja, os EUA) devem fazer esforços de redução comparáveis aos dos países sob Kyoto, tanto em quantidade total de reduções quanto em prazo de corte.
"O texto simplesmente se esqueceu dessa exigência, porque os EUA não querem comparabilidade." Também despertou a ira, especialmente entre os emergentes, o fato de que o texto foi feito por um grupo pequeno, o que foi considerado pouco democrático. "Queremos que o resultado surja a partir da participação de todas as partes", disse em entrevista coletiva o negociador-chefe da China, Su Wei.
"Entendemos o sentimento do governo dinamarquês em querer produzir um acordo positivo em Copenhague. Nós nos esforçamos para isso. Mas o processo tem de dar voz a todas as partes. Esperamos que o documento final traga os dois textos produzidos pelos líderes dos grupos de trabalho em um processo de baixo para cima", acrescentou o chinês.
O diplomata latino-americano ecoou o sentimento de Su, lembrando que a Dinamarca já havia proposto um texto "alternativo" antes, causando protestos dos países pobres. "Mais uma vez um texto dinamarquês atropela a situação", afirmou. "Há uma enorme crise de confiança: o G77 [bloco dos países em desenvolvimento] não confia na presidência dinamarquesa, e o Anexo 1 [países desenvolvidos] não confia no texto do [Michael] Cutajar [presidente do LCA]."
Nem mesmo a presidência da conferência se manteve. Connie Hedegaard renunciou ontem ao posto, para cedê-lo ao premiê dinamarquês Lars Rasmussen. O movimento era previsto, uma vez que Copenhague receberá 130 chefes de Estado e a cúpula precisa ser presidida por um chefe de Estado. Mas isso parou os diálogos ontem.
Enquanto negociadores patinam, países como as Maldivas se desesperam. "A ciência é muito clara: um aquecimento acima de 1,5C afogará meu país", disse Nasheed, emocionado. "Qualquer um que diga que não é possível limitar isso está dizendo que não é possível salvar meu país."

MARTA SALOMON viaja a convite da CNA



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