São Paulo, terça-feira, 18 de maio de 2004

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ASTROFÍSICA

Objeto observado por europeus desafia modelos de formação de astros com dezenas de vezes a massa do Sol

Grupo flagra nascimento de "estrela obesa"

Divulgação ESO
Imagem da nebulosa M 17; na parte inferior direita, área em que reside a estrela em formação


SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Um grupo europeu de astrônomos acabou de encontrar uma estrela que, ainda muito jovem, já sofre de obesidade mórbida. Está comendo toda a matéria que existe à sua volta, sem parar. Dentro em pouco, será um astro ultragordo, com tempo de vida limitadíssimo -uns 10 milhões de anos.
É um piscar de olhos, em termos astronômicos. O Sol, por exemplo, já chegou à meia-idade, mas mantém a boa forma e deve arder com saúde por mais uns 5 bilhões de anos. Astros esbeltos como ele são o "feijão com arroz" da Via Láctea, a galáxia espiral que abriga o Sistema Solar.
Muito mais raras são as estrelas supermaciças, com até 40 vezes mais massa que o Sol. A localizada pela equipe de Michael Sterzik, astrônomo do ESO (Observatório Europeu do Sul), tem cerca de 20 massas solares -isso caso ela esteja mesmo lá. O que o grupo de fato observou foi a nuvem de gás e poeira da qual essa estrela teria nascido e da qual ainda estaria se alimentando. No centro, uma área mais brilhante parece ser a estrela esfomeada, mas ainda não há certeza absoluta.
"Observações mais detalhadas nos próximos meses vão mostrar se é realmente um objeto estelar ou se é "apenas" alguma luz refletida", diz Dieter Nürnberger, também do ESO e um dos autores do estudo, publicado na última edição da revista científica britânica "Nature" (www.nature.com).
"Muitos detalhes do nosso objeto ainda não foram investigados ou compreendidos", prossegue Nürnberger. "Tentaremos aprender mais sobre essa protoestrela maciça nos próximos meses. Também procuraremos outros objetos que sejam similares. Mas essa busca pode muito bem falhar, porque protoestrelas maciças são extremamente raras e é extremamente difícil detectá-las."
A descoberta é a primeira observação indubitável de uma dessas estrelas enormes em formação. E o material em forma de disco girando ao seu redor parece já impor certos desafios a alguns dos mais tradicionais modelos de formação estelar. Eles sugerem que estrelas com mais de dez massas solares não poderiam se formar como o Sol, a partir de um disco de poeira, mas sim pelo choque de várias estrelas de porte médio.
"Com relação à formação de estrelas de baixa massa, como o nosso Sol, já entendemos a maior parte da física e da química envolvidas, e nossos resultados não devem mudar nosso conhecimento atual sobre isso", diz Nürnberger.
"No entanto, com relação à formação de estrelas de alta massa, há, até agora, dois modelos teóricos concorrentes: o modelo de acreção -reunião de gás e poeira num disco circunstelar- e o modelo de coalescência -colisão de protoestrelas de massa menor. Junto com outros resultados nossos sobre protoestrelas, no ano passado, nossa nova descoberta sugere que estrelas de alta massa podem de fato se formar via acreção. Então, se quiser expressar isso em terminologia futebolística, o placar atual é de dois a zero para o modelo de acreção."
O jogo, entretanto, ainda não está decidido. "A formação de estrelas de alta massa sempre foi meio enigmática, não é fácil conciliá-la com os modelos", afirma Michael Sterzik. "Mas são observações como essa que desafiam e fazem avançar as modelagens."
A protoestrela balofa, localizada na nebulosa M 17, a 7.000 anos-luz da Terra, provavelmente nem vai ter planetas. "É provável que nenhum sistema planetário se forme. E, mesmo que ocorra, ele será violentamente destruído uma vez que ela exploda como supernova, em 10 milhões de anos", diz Nürnberger. Ao que Sterzik completa: "Não há muita esperança para se viver em paz por lá".

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