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ANÁLISE
Um ano depois, "Climagate" ainda lança sombra sobre questão do aquecimento
MARCELO LEITE
DE SÃO PAULO
A revista britânica "Nature" publica nesta semana
uma entrevista reveladora
com Phil Jones, climatologista que se tornou o pivô do escândalo conhecido como
"Climagate" há um ano.
Acusado de manipular e
ocultar dados e de distorcer a
ciência ligada ao aquecimento global, a partir de e-mails
furtados por hackers dele e
de seus colegas, Jones foi
inocentado. Conta que recebeu ameaças, que pensou em
suicídio e que, por alguns
meses, só dormia com a ajuda de remédios.
O abatimento de Phil Jones
mostra como o pesquisador
médio está mal preparado
para enfrentar a guerrilha
movida pelos "céticos do clima", que defendem que o
aquecimento causado pelo
homem não existe.
Eles têm por objetivo central plantar uma semente de
dúvida na ciência do clima,
no que são auxiliados pelas
incertezas inerentes à atmosfera. Bombardeiam os adversários com questionamentos
e pedidos de informação, a
fim de garimpar deslizes que
possam tornar-se munição.
No caso dos e-mails furtados dos servidores da Universidade de East Anglia (Reino
Unido), onde Jones chefiava
a Unidade de Pesquisa de Clima (CRU, na sigla em inglês),
funcionou por algum tempo.
Comentários cruéis, frases
ambíguas e recomendações
maliciosas davam verossimilhança à tese de que a CRU
participava de uma conspiração para fraudar a ciência e
calar os "céticos".
Jones afastou-se do cargo.
Foi investigado por mais de
uma comissão. Nenhuma encontrou provas de fraudes,
embora ainda não esteja
afastada a hipótese de que
ele tenha apagado e-mails
eventualmente comprometedores. Jones passou na prova, mas raspando, porque o
conteúdo de algumas mensagens vazadas jamais enfeitaria a biografia de alguém.
Sonegar dados e sugerir
destruição de mensagens
destoam da ética de transparência em pesquisa, baseada
na ideia de verificabilidade.
Pode-se tentar explicar a atitude de Jones pela futilidade
e insinceridade dos pedidos,
mas não justificá-la.
Jones se deixou aprisionar
pela lógica de guerra dos "céticos" e se pôs na defensiva.
Só ele tinha algo a perder
com isso. Daí todo o abalo.
Os "céticos" desferem seus
ataques desde uma zona cinzenta, entre a periferia da
pesquisa (há poucos cientistas atuantes na área em suas
fileiras) e a franja de "think
tanks" conservadores dos
EUA. Malícia e táticas de propaganda não lhes mancham
a reputação, em especial se
bem sucedidas.
A ciência do clima é importante demais para permanecer refém desse conflito.
Se a maioria dos climatologistas considera desonestos
os argumentos e táticas dos
"céticos", estão obrigados a
se aparelhar para combatê-los em público. E isso sem
usar como recurso métodos e
subterfúgios que lancem
sombras sobre a credibilidade das relevantes respostas
que buscam -e que aos negacionistas interessa desacreditar de antemão.
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