São Paulo, sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

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Sem clima, chefe de convenção da ONU sai

Holandês Yvo de Boer renuncia em meio à frustração com fiasco de Copenhague para virar lobista em firma de consultoria

Diplomata deixa cargo em junho, meses antes de nova reunião no México que deve tentar elaborar um acordo contra emissões de carbono


Olivier Morin - 19.dez.2009/France Presse
O chefe da Convenção do Clima, Yvo de Boer, ergue a mão durante entrevista no fim da conferência de Copenhague, em dezembro

LUCIANA COELHO
DE GENEBRA

Yvo de Boer, o chefe da Convenção do Clima da ONU, anunciou ontem que deixará o cargo em 1º de julho, em meio à frustração generalizada com o colapso das negociações para conter o aquecimento global. Sua saída não só expõe os impasses do processo nas Nações Unidas como lança de vez o debate sobre clima à deriva.
Não se sabe ainda quem sucederá o holandês como secretário-executivo da convenção, um organismo que tem a missão de costurar um acordo global sobre o clima e que congrega, entre seus 194 membros, de países petroleiros a Estados-ilha sob risco de submergir.
De Boer, 55, será funcionário da firma global de consultoria e auditoria KPMG. O cargo foi criado para ele e, embora esteja sendo definido, incluirá viagens e constante contato com empresas e governos para "aconselhamento em questões de sustentabilidade", além de atuação em eventos.

Empresas na frente
"Sempre disse que, embora os governos forneçam o arcabouço necessário em políticas, as verdadeiras soluções devem vir das empresas", declarou.
"Copenhague não nos deu um acordo claro em termos legais, mas o compromisso político e a ideia de rumarmos a um mundo de baixas emissões são vigorosos. Isso pede novas parcerias com o setor de serviços", prosseguiu, em nota.
Os contatos entre De Boer e a empresa começaram, segundo uma fonte familiarizada com a contratação, antes do colapso de Copenhague, em dezembro.
Embora tenha definido sua saída como "decisão difícil", De Boer já tinha dado sinais de sua insatisfação com o processo, que avança para a próxima etapa, em dez meses, no México.
Na Dinamarca, economizou nas entrevistas coletivas de praxe, limitando-se a um comunicado em que chamava o Acordo de Copenhague de "carta de intenções". Quando falou, há um mês, disse que os resultados foram "frustrantes".
Sugeriu que o processo atual, em que todos debatem todas as decisões, fosse substituído por uma negociação "em partes": alguns poucos países tomariam as decisões-chave e caberia aos demais referendá-las.
Sem De Boer, é difícil apostar se a ideia vingará ou não. Nos quatro anos em que esteve à frente da UNFCCC, o midiático diplomata holandês elevou a proeminência da convenção como nenhum de seus antecessores, reunindo-se com líderes e participando de conferências mundo afora. De instituição discreta, a convenção passou à vitrine das Nações Unidas.
Por ora, as metas de corte de emissão propostas pelos países não manterão o aquecimento do planeta em até 2C por século, teto que cientistas dizem ser seguro. Os principais emissores, China e EUA, continuam a fugir de metas enquanto trocam acusações e exigências.
As dúvidas crescem mais porque Copenhague pariu um documento que, sem o status de compromisso legal, não norteia nada e ainda se soma aos dois trilhos da negociação.
"De Boer renunciar é a antecipação de algo que provavelmente aconteceria de qualquer forma, e saindo antes ele dá mais tempo para alguém novo chegar", afirmou à Folha o maltês Michael Zammit-Cutajar, primeiro secretário-executivo da Convenção.
"O problema-chave é entender o que vai acontecer em uma situação tão confusa", disse. "Espero que, sob a liderança do México, haja alguma ordem no processo até o fim do ano. É importante saber se os mexicanos vão iniciar consultas."


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