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ZOOLOGIA
Levantamento em área de conservação gerenciada por comunidade guarani descobre ali mais de 1.000 dos felinos
Parque boliviano é maior "casa" de onças
CLAUDIO ANGELO
EDITOR-ASSISTENTE DE CIÊNCIA
Os índios tupis e guaranis criaram a palavra "jaguar" para designar o maior felino das Américas, mais conhecido no Brasil como onça-pintada. Nada mais justo, portanto, que num parque nacional gerenciado por uma comunidade guarani esteja a maior população de onças já estimada no
planeta para uma área de conservação: mais de 1.000 indivíduos.
A zona em questão é o Parque
Nacional Kaa-Iya del Gran Chaco,
que ocupa 34,4 mil quilômetros
quadrados no sudeste boliviano
(uma área maior que a da Bélgica). Um levantamento realizado
ali por cientistas da Bolívia e dos
EUA indica que essa população
não corre risco de se extinguir nos
próximos cem anos.
O estudo foi liderado pelo biólogo boliviano Leonardo Maffei, da
Fundação Ivy-Anhambae, em
Santa Cruz de la Sierra. Começando em 2001, Maffei e seus colegas
Erika Cuéllar e Andrew Noss usaram armadilhas fotográficas para
flagrar as onças em diversos pontos do parque.
As armadilhas são espécies de
engenhocas compostas de um par
de câmeras fotográficas e sensores de calor ou movimento que
disparam sempre que um animal
de determinado tamanho os atravessa. Na pesquisa realizada pelo
trio, publicada no mês passado na
revista científica "Journal of Zoology", as armadilhas fotográficas
foram colocadas em locais com
maior probabilidade de visitação
por onças, como trilhas e lagoas.
Depois de reveladas as fotos e
descontadas imagens repetidas de
um mesmo indivíduo, os pesquisadores puderam estimar a densidade de onças no parque boliviano. O grupo chegou à cifra de dois
a cinco animais em cada 100 km2.
Não é exatamente uma densidade enorme, mesmo para esse normalmente raro predador de topo
de cadeia: valores mais altos já foram estimados para o Pantanal e
para as selvas tropicais de Belize.
A surpresa para os pesquisadores, no entanto, não foi o número
em si, mas o tipo de ecossistema
no qual ele foi computado: as florestas secas do Chaco boliviano.
"Nós costumávamos assumir
que a onça era um animal de florestas úmidas, mas ela parece estar se dando bem em florestas secas", afirma o geógrafo norte-americano Andrew Noss, da WCS
(Sociedade Mundial para a Conservação), co-autor do trabalho.
Com 1 milhão de quilômetros
quadrados, o Chaco é uma das
maiores regiões ecológicas do
continente americano (tem cerca
de um quinto da área da Amazônia). Uma população estável de
onças num local como esse pode
levar à conclusão de que a espécie
está muito melhor de saúde do
que se imaginava.
Para Noss, essa é uma conclusão
apressada: primeiro, porque não
existem estimativas populacionais anteriores. Assim, não há padrão de comparação. Além disso,
ameaças à espécie ainda são grandes em algumas partes da Amazônia, como em Mato Grosso, no sul
do Pará e no parque de Maididi,
na Bolívia, onde a caça e o desmatamento reduziram tanto o hábitat quanto a quantidade de presas
para os carnívoros.
"O número não me serve de
consolo", diz o brasileiro Peter
Crawshaw, do Ibama (Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e
dos Recursos Naturais Renováveis), um dos maiores especialistas em onça pintada do mundo.
"É uma notícia boa de saber, mas
você precisa considerar que elas
[as onças] estão em situação muito pior na maior parte de sua distribuição [e extintas em 37% de
seu território original]", diz.
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