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PERISCÓPIO
Tamanho do cérebro e fatores do ambiente
JOSÉ REIS
especial para a Folha
Na ordem dos mamíferos há
grande variação no tamanho do
cérebro. Quando se compara o
volume desse órgão, observa-se
a inexistência de uma relação linear. O que há, em geral, é uma
relação comandada pelo expoente 0,75, isto é, a massa cerebral corresponde à do corpo elevada ao expoente 0,75.
É por isso possível prever, em
face do tamanho de um mamífero, qual deverá ser o peso de seu
cérebro. Acontece, todavia, que
em certas espécies o cérebro é
maior do que o previsto pela
equação. Vários biólogos têm investigado os possíveis motivos
desse excesso ponderal em relação ao previsto.
No começo desta década foi
muito discutida e teve certa aceitação a hipótese de R. Martin,
atualmente no Museu Antropológico de Zurique, que liga a taxa
metabólica materna àquela
equação. Era simples a razão
principal dessa hipótese: a taxa
metabólica, como o tamanho cerebral, também corresponde à
potência 0,75 do peso corporal.
Dessa noção se aproxima a proposta por M.A. Hoffman em
1983, segundo a qual o fator condicionante do tamanho cerebral
é o tempo de gestação.
Ambas as hipóteses parecem
todavia ruir diante dos resultados obtidos por M. Pagel e P.
Harvey, da Universidade Oxford
("Evolution", 42, 948), que, de
suas comparações sistemáticas
dos pesos corporal e cerebral em
várias espécies, concluíram que
o determinante principal do tamanho cerebral é antes de tudo a
estratégia de vida adotada pela
espécie.
Se ela tem um longo período
de vida e procria individualmente e com intervalos longos, produzirá descendência com cérebro grande. Se, ao contrário, a espécie tem vida breve e gera descendência numerosa, então sua
prole apresentará cérebro menor.
No exame desta questão é preciso levar em conta que alguns
mamíferos produzem prole indefesa (ou altricial), ao passo que
os recém-nascidos de outros
(precoces) só dependem da mãe
para mamar, dela se libertando
assim que nascidos para explorar o mundo. Embora não haja
diferença geral de tamanho entre
os adultos dos dois grupos, os altriciais têm cérebro bem menor
que os precoces.
Pelo que se vê, há uma grande
variação no tamanho cerebral
dos neonatos, que a taxa metabólica materna por si só não explicaria. Mas as explicações de
Martin e Hoffman receberiam
apoio se as espécies que geram
prole precoce também tivessem
taxas metabólicas e período de
gestação maiores em relação ao
tamanho do corpo.
Para verificar esse ponto, Pagel
e Harvey examinaram 116 espécies de mamíferos pertencentes a
13 ordens diferentes. Na comparação dos pesos cerebrais entre
altriciais e precoces, tomaram
como peso cerebral a soma dos
cérebros de cada ninhada, em
geral um nos precoces e vários
nos altriciais. A conclusão a que
chegaram foi a de que a massa
cerebral da ninhada não aumenta proporcionalmente à taxa metabólica.
Segundo os dois pesquisadores, os mamíferos precoces produzem neonatos com tamanho
cerebral grande, sem necessidade de maior mobilização energética relativa. As diferenças, que
chegam a ser de duas a três vezes
nos tamanhos cerebrais dos neonatos em espécies precoces e altriciais, podem explicar-se, dizem Pagel e Harvey, quase exclusivamente por diferenças em
tempo de gestação e tamanho da
prole, "independentemente da
taxa metabólica e do tamanho
materno".
Dos dados coletados por Pagel
e Harvey verifica-se que 23 famílias tinham prole com cérebro
maior do que o previsto pelo tamanho materno. Vinte dessas famílias tinham tempo de gestação
maior que o previsto para seu tamanho e 18 tinham um só filhote
de cada vez. Entendem eles que a
formação de cérebros grandes é
dispendiosa do ponto de vista
reprodutivo, mas, como salienta
R. Lewin ("Science", 242, 514),
também importam consequências cruciais para a ecologia evolucionária da espécie.
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