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NEUROCIÊNCIA
Grupo nos EUA repete com pessoas parte de experimento em que cérebro de macaco moveu braço robótico
Ciborgue humano é viável, indica estudo
MARCELO LEITE
EDITOR DE CIÊNCIA
Os ciborgues estão chegando
-devagar, mas com passos firmes. O último, e mais importante,
será dado na terça-feira, com a
publicação de um estudo demonstrando a viabilidade, em humanos e não mais em macacos,
das interfaces cérebro-máquina.
E um dos autores é brasileiro.
Miguel Nicolelis, 43, neurocientista paulistano e palmeirense formado na USP, ganhou notoriedade mundial ao permitir que sinais
de cérebros de macacos movessem um braço robótico. Desta vez, ele se
juntou ao neurocirurgião Dennis
Turner, também da Duke, para
repetir uma versão reduzida do
experimento com seres humanos,
pesquisa que consumiu 18 meses.
Nicolelis precisava provar que
os microeletrodos usados nos símios funcionariam também com
pessoas, coletando diretamente
dos neurônios comandos com informação suficiente para governar robôs, como um braço mecânico ou uma cadeira de rodas
computadorizados.
A prova de princípio, como dizem os cientistas, foi obtida durante 11 cirurgias para tratar o mal
de Parkinson, realizadas em 2003.
Em cada uma delas o paciente receberia um estimulador cerebral
profundo, uma espécie de marca-passo que ajuda a eliminar os tremores que arruínam a vida dos
parkinsonianos graves. A equipe
teve consentimento dos pacientes
e autorização de comitês de ética
para usar não mais do que cinco
minutos da cirurgia no teste.
Acordados e com uma cânula
introduzida até a região cerebral
do tálamo por um orifício no topo
do crânio, os operados foram
submetidos a um videogame primitivo: apertando uma pêra de
borracha (sensor de pressão), tinham de cobrir um alvo verde
com uma barra preta no vídeo.
Cada um realizou cerca de 50
"partidas", até se cansar.
Análise posterior
Enquanto jogavam, eram gravados os impulsos emitidos por um
grupo de neurônios envolvidos
na tarefa motora. Isso foi feito por
intermédio de 32 microfios introduzidos através da cânula no tecido subcortical (abaixo do córtex
cerebral, que é a região mais nobre do órgão). Os dados foram armazenados num computador e
depois analisados.
Essa análise revelou que, a
exemplo do que ocorrera com
macacos em experimentos anteriores, os sinais coletados de uma
pequena amostragem da legião de
neurônios envolvidos contêm informação suficiente para predizer
o comportamento motor. Isso
quer dizer que as ordens emitidas
pelas células cerebrais seriam suficientes para acionar um braço
mecânico, mesmo que a pessoa tivesse perdido o próprio braço ou
a capacidade de movê-lo.
"Apesar das limitações dos experimentos, ficamos surpresos ao
descobrir que nosso modelo analítico pode predizer muito bem os
movimentos dos pacientes", diz
Nicolelis. "Tivemos cinco minutos com cada paciente, dos quais
foram necessários um minuto ou
dois para treiná-los na tarefa. Isso
sugere que, na medida em que estudos clínicos progredirem e com
o uso de feixes de eletrodos implantados por um longo período
de tempo, poderemos obter um
sistema de controle funcional para dispositivos externos."
O neurocientista prevê que serão necessários uns cinco anos
para chegar a algo como uma cadeira de rodas motorizada comandada por neurônios de tetraplégicos. Antes disso, ele pretende
obter licença para fazer implantes
similares em pacientes imobilizados, mas que fiquem instalados
dentro do cérebro por um mês,
por exemplo, e acoplar o sistema a
algum dispositivo robótico.
Se funcionar tão bem quanto
funcionou com macacos, Nicolelis diz que a questão passa a ser exclusivamente de engenharia:
construir dispositivos que possam ser implantados definitivamente e provar que não trarão danos aos futuros ciborgues (neologismo criado a partir da expressão "organismo cibernético").
Também figura entre os projetos do grupo da Duke aperfeiçoar
os sistemas com um "feedback"
mais refinado que o meramente
visual. A idéia é posicionar eletrodos em outras regiões do cérebro
do paciente, para devolver-lhe informações provenientes da prótese robótica -tato, por exemplo.
"O tato é fundamental para dar
"feedback". Não se pode julgar peso só com o visual", diz Nicolelis.
Ainda vai demorar para ver Robocops nas ruas, mas o tempo dos
ciborgues já está chegando.
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