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Brasil importará poluição, disseram EUA
Afirmação está em documento de 1972 produzido pelo Departamento de Estado na véspera de 1ª conferência ambiental
Análise ecoa em posições
defendidas hoje pelo país
em reuniões ambientais,
como a aversão à vigilância
externa sobre a Amazônia
SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON
"No futuro, o Brasil poderá
até mesmo se tornar um "porto
seguro de poluição" para empresas que estejam procurando
escapar a restrições de países
com controles." A frase está no
documento intitulado "Brazil
-If Development Brings Pollution, so Be It" ("Brasil - Se o Desenvolvimento Traz Poluição,
Que Assim Seja").
Seu autor é o Departamento
de Estado norte-americano. O
texto, disponível online desde
que foi "desclassificado" (jargão dos serviços de inteligência
para documentos que deixam
de ser secretos), mas nunca antes publicado, traz a data de 28
de fevereiro de 1972.
Escrito por Ruth M. Schimel
e aprovado por Godfrey H.
Summ, da Chancelaria norte-americana, o relatório procurava dar uma panorâmica da situação do meio ambiente ("ecologia" era palavra mais em
voga então) no Brasil para o governo Nixon (1969-1974).
Foi feito às vésperas do que é
considerado o primeiro encontro multilateral sobre o tema, a
Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano,
realizada em Estocolmo, na
Suécia, em 1972.
As críticas feitas então encontram eco 35 anos depois,
quando o mundo se prepara para debater o tema da vez na
"ecologia" -as mudanças climáticas- em Bali, na Indonésia, no mês que vem.
A oposição do Brasil a controles externos, diz o documento, "reflete medos profundos de
que tais controles possam frustrar seu impressionante crescimento econômico e o cumprimento de seu destino de potência mundial".
"A política brasileira oficial
[...] coloca objetivos de desenvolvimento acima do controle
da poluição e busca forçar os
países desenvolvidos a assumir
a responsabilidade pelo controle da poluição", escreve
Schimel no começo.
A sentença poderia se referir
a posições que o Brasil tem defendido em encontros ambientais internacionais, como a de
que os países do Terceiro Mundo não podem abrir mão de seu
"direito de poluir" em nome do
desenvolvimento.
Um esboço do decreto que
propõe a elaboração do Plano
Nacional de Mudanças Climáticas, que o governo Lula promete aprovar em 2008, reflete
esse tipo de posição. A Folha
publicou trechos do decreto no
dia 10. Instado então pelo jornal a comentá-lo, Marcelo Furtado, do Greenpeace, fez crítica
similar ao que já alertava o Departamento de Estado há mais
de três décadas.
"A única coisa que está assegurada aqui é que o desenvolvimento econômico não será afetado(...) Essa era a posição brasileira em 1972 em Estocolmo."
O documento foi elaborado
pelo hoje extinto Escritório de
Pesquisa e Análise das Republicas Americanas, subordinado ao Escritório de Inteligência
e Pesquisa da Chancelaria norte-americana, então comandada por William Pierce Rogers
(1913-2001). Seu texto é bastante duro com a política ambiental brasileira.
No geral, afirma, os brasileiros "continuarão a estimular
investimentos em grande escala que apóiem seus objetivos de
desenvolvimento, mesmo que
isso signifique "importar poluição"." E conclui com a frase do
início dessa reportagem.
Em outro trecho, o documento arrisca uma análise do
cenário político brasileiro:
"Aqueles que fazem as políticas
públicas estão de acordo entre
si e dizem que padrões internacionais serão usados para manter as nações em desenvolvimento dependentes".
Outros, continua, "como
membros do fraco Congresso e
o presidente do Instituto de
Estudos Oceânicos [Instituto
Oceanográfico], admitem os
perigos da poluição, mas no geral pedem soluções brasileiras
para problemas brasileiros".
NA INTERNET - Leia o documento e
a íntegra de sua tradução
www.folha.com.br/073232
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