São Paulo, domingo, 20 de dezembro de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ANÁLISE

É preciso substituir o caduco sistema da ONU

MARCELO LEITE
COLUNISTA DA FOLHA

Só se surpreende com o fracasso da cúpula do clima em Copenhague quem alimentava expectativas irracionais sobre o que poderia resultar dali. Tanto as circunstâncias políticas quanto as características estruturais da negociação recomendavam ceticismo. Presente e passado cooperam abertamente pela derrota da atmosfera.
A perspectiva de chegar a um novo tratado para enfrentar o aquecimento global foi desanuviada com a eleição de Barack Obama, em 2008. Saía de cena George W. Bush, o maior obstáculo entre chefes de Estado para um acordo que desatasse o nó górdio do superado Protocolo de Kyoto (1997).
Os EUA, no entanto, são hoje um país dividido. Além do tema da reforma da saúde, que monopolizou o debate no Congresso americano em 2009, o tema da mudança do clima também polariza a opinião pública do país e sua representação política. Só em 2010 haverá decisão sobre a política doméstica para o setor.
O descasamento entre o calendário político dos EUA e o da ONU, que marcava um desfecho para Copenhague, é o menor dos problemas. Não seria a primeira vez que se adia a conclusão de negociações internacionais sobre temas espinhosos. Muito mais séria é a provisão para o fracasso embutida no próprio sistema criado para concertar as ações de 193 países a fim de enfrentar o aquecimento global.
O processo multilateral consagrado pela ONU exige decisões por consenso. Em outras palavras, tudo se reduz ao mínimo denominador comum. A atmosfera da Terra, contudo, não espera pela lenta superação de barreiras e pela laboriosa acomodação de interesses características dessas negociações.
O longo percurso foi iniciado de fato há mais de 17 anos, com a adoção de um tratado genérico -a Convenção sobre Mudança do Clima- na cúpula do Rio, a Eco-92. Dela resultou o Protocolo de Kyoto, cinco anos depois. Além de mal arranhar o problema das emissões, Kyoto cristalizou uma divisão de responsabilidades entre países desenvolvidos e em desenvolvimento que não condiz mais com o porte do desafio.
No passado, EUA, Rússia, Japão e Europa foram os maiores responsáveis pelo aquecimento. No futuro próximo, serão China, Índia e Brasil. Sem um entendimento entre esses grandes atores, nada se conseguirá em favor do clima.
Está na hora de abandonar o bizantino sistema da ONU. É urgente criar um foro dos poluidores que contam e podem realmente decidir alguma coisa, em separado, sem ter de jogar para a plateia ruidosa reunida em Copenhague.

Texto Anterior: Copenhague 2009/ Análise: Legado será a desmobilização do público
Próximo Texto: Obama reconhece insuficiência de documento sobre o clima
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.