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Força-tarefa tenta recuperar imagem da ciência do clima
Para pesquisador, aumento da vigilância pública é necessário, mas deverá burocratizar e tornar ainda mais caros os estudos
Para biólogo que combateu
criacionistas, acabou a "era
da inocência" para cientistas
habituados a trabalhar sem
interagir com a sociedade
RAFAEL GARCIA
ENVIADO ESPECIAL A SAN DIEGO
Os ataques recentes à ciência
do aquecimento global levaram
a AAAS (Associação Americana
para o Avanço da Ciência) a
convocar um simpósio de
emergência em seu encontro
anual, na Califórnia. Na discussão, anteontem, os cientistas
não chegaram a um consenso
sobre como lidar com o problema, mas um pesquisador resumiu o que acha que vai acontecer: "A burocracia vai aumentar para os climatólogos".
O autor da frase é Gerald
North, físico da Universidade
A&M do Texas. Segundo ele, o
impacto que dois eventos tiveram recentemente na pesquisa
de clima deve estimular os próprios cientistas a aumentarem
o cuidado ao tratar e repassar
os dados que produzem, e isso
deixará as atividades do setor
mais trabalhosas.
Um dos casos foi o roubo de
e-mails de cientistas da Universidade de East Anglia, Reino
Unido, cujas mensagens sugeriam que pesquisadores se negavam a disponibilizar dados
públicos sobre temperaturas a
quem os pedisse. Outro era um
relatório do IPCC (painel do
clima da ONU) com previsões
exageradas sobre o sumiço de
geleiras no Himalaia.
São dois eventos pequenos
perto do grande volume de pesquisa feita sobre clima, mas foram suficientes para que jornalistas, políticos e pesquisadores
descrentes do aquecimento
global lançassem uma onda de
ataques sem precedentes.
"Isso realmente abalou a
confiança do público sobre a
condução da ciência, conforme
mediram várias pesquisas de
opinião, levantamentos, editoriais em jornais e reportagens",
disse o presidente da Academia
Nacional de Ciências dos EUA,
Ralph Cicerone.
"Não estávamos preparados
para isso", disse North, encarregado pela academia de auditar trabalhos polêmicos em climatologia em busca de fraudes
(leia texto abaixo). "A imprensa
não está interessada naquilo
que toda uma comunidade de
cientistas tem a dizer. Uma história sobre erro ou fraude, claro, é muito mais sedutora."
O físico afirma que os cientistas do clima terão de se preparar agora para trabalhar sob vigilância total, caso a climatologia queira recuperar a credibilidade pública que perdeu.
"Não sei se agora, quando
pesquisadores forem escavar
amostras de gelo no Ártico, alguém vai pôr um inspetor em
cima do ombro deles", disse
North à Folha. "Talvez não seja
uma ideia ruim, mas aumentará os gastos com pesquisas. Se
for algo feito no interesse da
transparência e do controle de
qualidade, será uma boa coisa."
Sugerir um sistema de vigilância para profissionais que
estão acostumados a trabalhar
com extrema liberdade não foram as únicas palavras duras
proferidas durante o encontro
da AAAS em San Diego.
O biólogo e ex-frade dominicano Francisco Ayala falou em
dar um fim à "era da inocência"
para os cientistas que ignoram
que precisam trabalhar na
fronteira entre conhecimento
e divulgação do conhecimento.
Ayala experimentou isso na
própria pele, tendo sido um dos
principais defensores da teoria
da evolução contra ataques de
criacionistas nos últimos anos.
A declaração ganhou apoio
de Sheila Jasanoff, da Universidade Harvard, que estuda o assunto. "Nós vimos o IPCC declarar que fazia um trabalho
"politicamente neutro" apesar
de ser "politicamente relevante", mas cientistas sociais que
conhecem essa área logo reconheceram isso como algo de
um trabalho nessa fronteira."
O geneticista Philip Sharp,
do MIT, Prêmio Nobel de Medicina, também foi convidado
para o simpósio por ter coordenado um relatório da academia
de ciências sobre boas práticas
com manuseio de dados. "Não
acho que isso seja algo em que a
comunidade científica esteja
investindo bem", disse.
Críticas à parte, nenhum dos
pesquisadores no simpósio atacou o consenso da climatologia,
segundo o qual o aquecimento
global existe e é causado por
humanos. Aberta a sessão de
perguntas, quando um espectador começou a elencar aquilo
que seriam provas da inexistência da mudança climática,
cada um dos convidados à mesa explicou por que confiava na
ciência do clima.
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