São Paulo, sábado, 21 de julho de 2001

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TECNOLOGIA

Cientistas brasileiros utilizam simulações de computador para reproduzir experimentos em escala atômica

"Alquimista virtual" cria novos materiais

SALVADOR NOGUEIRA
ENVIADO ESPECIAL A SALVADOR

Um grupo de cientistas anda lidando com a física de materiais de modo curioso. Em vez de a experimentação confirmar ou refutar a teoria, é a base teórica que confirma os experimentos. A aparente inversão do processo científico é obra de Adalberto Fazzio, físico da Universidade de São Paulo. E ele garante que os "alquimistas virtuais" estão a caminho.
Suas pesquisas consistem na construção de simulações de computador que reflitam o comportamento de materiais em escala atômica. Os resultados reproduzem dados obtidos experimentalmente, e ainda por cima os explicam de forma mais completa.
A equipe já andou utilizando seus modelos de computador para "comprovar" diversos experimentos práticos, como um feito nos EUA e publicado na revista "Science" em 1997 que mostrou a combinação de átomos de germânio em uma superfície de silício.
A simulação conseguiu chegar aos mesmos resultados, com a vantagem de oferecer explicações mais precisas sobre os processos que levaram à combinação das duas substâncias, mostrando a interação entre átomos individuais.
Com a técnica, os brasileiros conseguiram, inclusive, simular a imagem de microscópio de força atômica que seria obtida se o experimento fosse real, e ela batia com as fotos reais feitas anos antes pelo grupo americano.
"Além de explicar melhor processos que antes não entendíamos, outra grande vantagem é a rapidez", disse Fazzio à Folha. "Processos que são muito lentos na natureza podem ser acelerados no computador", afirmou.

Alquimia virtual
O grupo brasileiro já publicou este ano diversos trabalhos sobre a técnica na revista especializada "Physical Review Letters" (http://prl.aps.org). Alguns até envolvem algo que se aproxima da função que Fazzio atribui, com certa dose de licença poética, aos "alquimistas virtuais". A expressão deu título à conferência que ele deu quarta-feira, último dia da 53ª Reunião Anual da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), em Salvador.
A função desses "alquimistas virtuais" seria levar os modelos informatizados adiante, não apenas confirmando resultados experimentais, mas também "engenheirando" novos materiais, ao alterar variáveis da simulação (como temperatura, pressão e quantidade de átomos e moléculas envolvidas na mistura).
O repertório do grupo brasileiro é bastante amplo. Ele vai desde aplicações com silício, visando ao aumento de eficiência do material para a criação de placas de computador mais poderosas e menores, até os nanotubos de carbono -a coqueluche da área de nanotecnologia, que deve impulsionar ainda mais os computadores rumo à miniaturização no século 21.
Um dos feitos mais recentes foi a criação, em computador, de um nanofio de ouro -um arranjo de seis ou sete átomos de ouro, alinhados e interconectados.
Depois de subverter a ordem entre teoria e prática, a equipe também tem pretensões de fazer o caminho de volta, partindo das simulações para as experiências. O grupo mantém contato com diversos pesquisadores experimentais, para transpor a "alquimia virtual" para a realidade.


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