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análise
É cedo para enterrar a clonagem
MARCELO LEITE
COLUNISTA DA FOLHA
"Clonagem terapêutica." Nome pomposo, para
uma tecnologia que nunca
chegou a se materializar. E
que agora, com os trabalhos de Shinya Yamanaka
e de James Thomson, pode se tornar obsoleta antes
mesmo de provar-se.
A "terapia", no caso, era
retórica -uma promessa.
Pressupunha que a linha
de pesquisa inaugurada
com a fabricação da ovelha
Dolly redundaria, com
certeza, em terapias celulares para moléstias como
Parkinson e diabetes.
Com tanto debate ético,
a técnica até parecia estar
à mão. Engano: as células-tronco embrionárias
(CTEs) só haviam sido obtidas com clones de camundongos (terapia, mesmo, nem com eles).
É cedo para entusiasmar-se com as células pluripotentes induzidas
(CPIs) de Yamanaka e
Thomson. Ou dar a clonagem terapêutica por natimorta, como parece inclinado a fazer Ian Wilmut
(um dos "pais" de Dolly).
Primeiro, porque as técnicas de Yamanaka e
Thomson ainda precisam
ser aperfeiçoadas. A taxa
de sucesso é baixa, uma célula a cada 5.000 ou
10.000 manipuladas.
Além disso, as CPIs envolvem dois componentes
de risco: o uso de retrovírus a fim de contrabandear quatro genes para
dentro das células e algum
potencial cancerígeno
(um espectro sempre presente quando se trata de
células-tronco).
Para se tornar segura, a
técnica terá de livrar-se
dos retrovírus, pois não
faz sentido tratar alguém
com células infectadas. Será preciso encontrar uma
maneira de reativar os
mesmos genes, que estão
presentes -mas adormecidos- nas células que se
quer transformar, dispensando o acréscimo de cópias extras. Não é trivial.
Se comemorarem esse
sucesso tão relativo obtido
com células adultas, os inimigos da pesquisa com
embriões estarão mais
uma vez sendo parciais. Os
estudos de Yamanaka e
Thomson lhes dão alguma
razão, ao mostrar que há
alternativas viáveis à destruição de embriões para
pesquisar terapias celulares. Se mais viáveis, ou menos, o tempo dirá.
Até lá, será preciso decidir se há razão para bloquear uma avenida quando não há certeza de que a
outra será construída. No
Brasil, porém, as CPIs podem ser um alento, uma
vez que a "clonagem terapêutica", proibida pela Lei
de Biossegurança, de
2005, está fora de questão.
Nem mesmo o estudo
com uns poucos embriões
armazenados em clínicas
de fertilização está garantido, apesar de permitido
pela lei. Ainda falta o Supremo Tribunal Federal
decidir se o dispositivo é
constitucional -ou não,
como alega a Procuradoria
Geral da República, com
apoio de grupos religiosos
e conservadores.
O Supremo promete começar a julgar o caso em
dezembro. Quando o fizer,
correrá o risco de pronunciar-se sobre pouco mais
que ensaios preparatórios
para uma biotecnologia
em franca marcha para a
irrelevância.
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