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GENÉTICA
Grupo de Ribeirão Preto soletrou as letras do DNA de parasita que ataca 10 milhões de pessoas na América Latina
Genoma de fungo sofre por falta de verba
CLAUDIO ANGELO
EDITOR-ASSISTENTE DE CIÊNCIA
Em seu laboratório da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de
Ribeirão Preto, o geneticista Gustavo Henrique Goldman tem cinco computadores de alto desempenho apelidados de Freud, Lacan, Jung, Sartre e Voltaire. "Cansei de ter problemas psicológicos
por causa de dinheiro", explica.
O bom humor de Goldman, 42,
esconde certa apreensão: ele não
sabe se terá financiamento no ano
que vem para concluir o trabalho
de transcrição do genoma do fungo Paracoccidioides brasiliensis,
parasita que afeta 10 milhões de
pessoas na zona rural dos países
da América Latina.
O sequenciamento (soletração)
dos genes já foi feito, com a identificação de 4.700 deles. "Isso representa 50% do genoma", diz. O trabalho, a ser publicado em fevereiro na revista "Eukaryotic Cell" (http://ec.asm.org), foi o primeiro mapa genético de um fungo a
ser esboçado no país. Para produzi-lo, o grupo de Goldman olhou
apenas as sequências que estão
ativadas no micróbio enquanto
ele ataca seres humanos.
Agora, Goldman e seus colegas
da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto
(USP), da Universidade Federal
de São Paulo (Unifesp), da Universidade de Mogi das Cruzes
(UMC) e da Universidade do Vale
do Paraíba (Univap) aguardam financiamento para a segunda parte do trabalho -que vai avaliar,
entre outras coisas, quais são os
genes envolvidos na maior ou
menor capacidade do fungo de
causar uma doença grave e quais
genes estão efetivamente "ligados" durante a infecção.
Depois de terem catalogado todos os genes ativos do organismo,
os pesquisadores também pretendem começar a transcrever o
DNA completo do fungo, letra a
letra, da mesma forma como foi
feito o sequenciamento do genoma humano, para saber em detalhes como o parasita funciona. Isso é necessário porque as partes
do DNA de um organismo que
não codificam genes (geralmente
referidas como "junk-DNA", ou
"DNA-lixo") parecem ter funções
importantes de regulação da ativação e desativação dos genes que
ainda são desconhecidas.
Para o primeiro trabalho de sequenciamento, o grupo contou
com aproximadamente US$ 25
mil e R$ 45 mil, da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do
Estado de São Paulo) e do Pronex-MCT (Programa de Núcleos de
Excelência, Ministério da Ciência
e Tecnologia).
Essa segunda fase do projeto,
prevista para durar quatro anos,
deve sair mais salgada: o pedido
de financiamento feito à Fapesp
foi de R$ 1,5 milhão. Com a crise
orçamentária da fundação, disparada pela desvalorização do real
no fim do primeiro semestre, o P.
brasiliensis pode ter de esperar
para ter seus segredos completamente revelados.
Chip de DNA
O Paracoccidioides é um mal de
áreas rurais. Acredita-se que a frequência da infecção tenha a ver
com o aumento do desmatamento nessas regiões. Quando infecta
humanos, ele assume a forma de
uma levedura, assim como um
outro fungo comum entre humanos -Candida albicans, causadora da candidíase- e provoca uma síndrome pulmonar que pode levar à morte.
A segunda etapa do trabalho de
decifração do parasita consiste
em descobrir como funcionam os
genes que o tornam perigoso.
Para isso, sequências genéticas
retiradas do fungo em diversos
estágios da infecção deverão ser
inseridas em chips de DNA, pequenas placas de vidro nas quais
se depositam trechos de DNA conhecidos. Quando a sequência
que se deposita na placa "casa"
com a sequência que está lá, os
cientistas sabem que aquele gene
específico está ativo naquela etapa
particular da doença.
Tiro ao alvo
"Conhecendo os genes que estão ativos na infecção, você pode
ter alvos para medicamentos contra o fungo", disse Goldman. Isso
também é importante para identificar as cepas (linhagens) mais
agressivas do P. brasiliensis.
Outro teste que deverá ser feito
na segunda parte da pesquisa é a
infecção de cobaias, para observar
como o parasita interage com os
genes do hospedeiro.
"O P. brasiliensis não é um organismo inteiramente oportunista, ou seja, ele ataca quem tem um
sistema imunológico intacto. Precisamos entender a biologia do
hospedeiro e da doença", afirma
Goldman.
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