São Paulo, quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

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Mudança do clima já esquenta Antártida

Estudo indica aquecimento geral do continente, negando visão anterior; temperatura no oeste subiu mais

MARCELO LEITE
COLUNISTA DA FOLHA

Não resta muita dúvida: a parte mais vulnerável da Antártida também está se aquecendo, como o resto do mundo. A tendência vale ainda para o continente como um todo e para a última metade de século, sustenta artigo no periódico científico "Nature" de hoje.
A Antártida inteira esquentou cerca de 0,6C de 1957 a 2006. Na Antártida Ocidental, aquele terço do continente voltado para a América do Sul, o aquecimento foi ainda mais acentuado: 0,85C.
Os dois terços orientais viram os termômetros subirem menos: 0,5C. Isso subverte a visão tradicional sobre o continente gelado em tempos de mudança climática: aquecimento só na península Antártica e resfriamento do resto (sobretudo a Antártida Oriental).
O grupo liderado por Drew Shindell (Nasa) e Eric Steig (Universidade de Washington) usou poucos dados de estações meteorológicas. Elas não chegam a meia centena e estão localizadas perto da costa. Não servem para estimar a temperatura do continente inteiro.
"Ouve-se o tempo todo que a Antártida está se resfriando, e não é esse o caso", alerta Steig. "A Antártida não está se aquecendo na mesma taxa em todo lugar e, enquanto algumas áreas vêm se resfriando por muito tempo, a evidência mostra que o continente como um todo está ficando mais quente."
Steig e Shindell recorreram a medidas de temperatura tomadas por satélite, que cobrem toda a Antártida. Como esses dados só estão disponíveis para o último quarto de século, eles treinaram seus computadores para inferir as temperaturas dos 25 anos anteriores com base nos últimos 25 anos.
"O resultado não me surpreende", afirma Jefferson Cardia Simões, glaciologista da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). "Se olharmos os artigos científicos que modelam o impacto de um aquecimento atmosférico, aparece primeiro o aquecimento da península e depois o da Antártida Ocidental."
A constatação dos americanos é preocupante, mas está longe de motivar pânico. A ameaça maior ainda vem das geleiras da Groenlândia, no outro extremo do globo (Ártico). Mesmo estas levariam séculos para derreter, elevando o nível dos mares em vários metros.
O problema é que a Antártida contém dez vezes mais gelo do que a Groenlândia. A maior parte, 70%, se concentra na Antártida Oriental, que é mais fria, tem manto de gelo mais espesso e é mais estável. O restante fica na parte ocidental. Ela é mais quente, recebe mais neve e tem mais correntes e mais plataformas de gelo para se acelerarem e romperem. Em duas palavras, é a Antártida mais dinâmica e mais vulnerável.
Segundo Shindell, a parte a oeste da Antártida é mais suscetível a escorregamento do manto de gelo em direção ao mar. "Não tão vulnerável quanto a Groenlândia, mas não é invulnerável", diz. Trata-se de um risco de longo prazo, no entanto, coisa para séculos, ou milênios.


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