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Físico teletransporta um átomo
Tecnologia ainda não pode transmitir gente, mas servirá para criar supercomputador, diz cientista
Grupo fez com matéria o que já tinha feito com luz; experimento se baseou em efeito da física quântica ridicularizado por Einstein
RAFAEL GARCIA
DA REPORTAGEM LOCAL
Um grupo de pesquisadores
dos EUA anunciou ontem o sucesso de um experimento com
teletransporte que, pela primeira fez, conseguiu transmitir
matéria entre dois locais.
A técnica já tinha tido sucesso com o teletransporte de luz,
mas um estudo na edição de
hoje da revista "Science", assinado por físicos da Universidade de Maryland, descreve o teletransporte de um átomo (na
verdade um íon, átomo eletricamente carregado) do metal
itérbio pelo espaço de um metro: uma distância enorme, em
termos quânticos.
Para decepção dos fãs de ficção científica, porém, não é ainda um dispositivo como o da espaçonave da série de TV "Jornada nas Estrelas" que fazia a
tripulação se desmaterializar
em um lugar e se materializar
em outro, do nada. O que os
cientistas fizeram agora foi
transportar características físicas de uma partícula de itérbio
para outra, instantaneamente
(veja quadro acima).
Não é pouca coisa, se considerarmos que aquilo que define
a essência dos átomos que compõem as pessoas também são
essas características, que os físicos chamam de "estados
quânticos". Em teoria, é possível teletransportar um grupo
maior de átomos, mas as dificuldades técnicas crescem exponencialmente com o tamanho e complexidade do objeto a
ser transmitido.
A principal perspectiva de
aplicação da técnica, porém,
não é mesmo o transporte público. O teletransporte de átomos individuais, por enquanto,
acena como um modo de armazenar e transmitir informações
em computadores quânticos
-máquinas com poder de cálculo imenso, que por enquanto
só existem mesmo em teoria.
Com o sucesso do experimento, os cientistas já falam
agora na possibilidade de criar
uma "internet quântica".
"Os íons atômicos usados no
experimento servem como
uma excelente "memória quântica", para guardar informação,
algo que seria difícil fazer usando apenas fótons", disse à Folha Steven Olmschenk, físico
que liderou o experimento. "O
protocolo de teletransporte
que demonstramos aqui pode
ser um componente vital de
computadores quânticos."
Ação fantasma
O teletransporte de partículas foi concebido em teoria em
1993 e realizado pela primeira
vez em 1997. Outro grupo dos
EUA teletransportou fótons
-partículas de luz- entre dois
pontos. Só depois de uma década, porém, é que se conseguiria
o teletransporte de uma partícula de matéria, anunciado
agora por Olmschenk.
O truque por trás dos experimentos é um fenômeno que os
físicos chamam de emaranhamento -uma espécie de ligação
instantânea entre duas partículas que podem estar distantes. Quando uma é manipulada
em um ponto, a outra imediatamente se altera também.
Por ser altamente contraintuitiva, a ideia que fundamentou o emaranhamento era altamente criticada algumas décadas atrás. O próprio Albert
Einstein, um dos padrinhos da
física quântica, rejeitava esse
tipo de "telepatia" entre partículas, que chamava de "ação
fantasma à distância".
Mas os fatos -uma série de
experimentos, na verdade- calaram o grande gênio. Hoje é
consenso entre cientistas que o
emaranhamento existe, apesar
de físicos e filósofos ainda estarem debatendo como interpretar a realidade por trás dele.
Segundo o físico brasileiro
Amir Caldeira, da Unicamp, o
anúncio de um experimento
como o de Olmschenk era uma
questão de tempo. "Ele não teve uma originalidade de ideia
física, mas foi original na maneira com que aplicou as coisas", disse. Caldeira lidera uma
rede brasileira para pesquisa de
informação quântica, campo
que está fervilhando agora.
Olmschenk diz que a grande
dificuldade do experimento foi
manipular partícula por partícula sem perder informação.
Em meio à corrida pelo computador quântico, ele diz que espera poder contribuir para os
debates de questões mais filosóficas com seu experimento.
"O estado de emaranhamento de fato demonstra a estranheza da física quântica, e o estudo dos mecanismos pelos
quais ele é criado e destruído é
de grande interesse", diz.
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