São Paulo, domingo, 23 de março de 2008

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Grupo refaz passos de Darwin no Brasil

Pesquisadoras do Rio localizam estrada usada pelo pai da teoria da evolução e fazenda onde ele se hospedou há 176 anos

Projeto antecipa celebração do Ano de Darwin, em 2009; floresta elogiada por ele em Niterói é hoje ponto de "desova" de cadáveres

ITALO NOGUEIRA
DA SUCURSAL DO RIO

Após 176 anos da passagem do navio inglês HMS Beagle pelo Brasil, um grupo de pesquisadores brasileiros busca as "pegadas" deixadas no país por seu passageiro mais ilustre: o naturalista Charles Robert Darwin (1809-1882).
Uma pequena parte do trajeto feito no Rio já foi identificada. Pesquisadoras da UFF (Universidade Federal Fluminense) localizaram uma estrada usada por Darwin e uma fazenda onde o cientista repousou em viagem pelo interior.
O então estudante de 22 anos de Cambridge embarcou no navio da Marinha britânica em 1831, acompanhando uma expedição cujo objetivo era dar uma volta ao mundo e identificar rotas de navegação.
Darwin estudava para ser clérico e teve de convencer o pai a deixá-lo embarcar no Beagle e ficar quatro anos e nove meses longe de casa. Durante a viagem, escreveu um diário e um caderno de campo em que descrevia o ambiente que via. As observações culminaram na teoria da seleção natural como mecanismo da evolução.
O diário, publicado depois no livro "A Viagem do Beagle", serviria ainda de inspiração a outro jovem naturalista, o galês Alfred Russel Wallace. Ele acabou descobrindo a seleção natural de forma independente. Os trabalhos de ambos foram apresentados à Sociedade Lineana de Londres em 1858. No ano seguinte, Darwin publicou "A Origem das Espécies", um dos livros mais importantes da história da ciência.

Força-tarefa
A busca pelas marcas de Darwin no Brasil faz parte das comemorações, no ano que vem, de 200 anos de seu nascimento e de 150 anos da publicação do livro que marcou a ciência.
O Rio de Janeiro foi o local onde ele passou mais tempo no país. Durante os 93 dias em que permaneceu na região, viajou até Macaé (a 188 km da capital), caçou no Jardim Botânico e morou em Botafogo, ao pé do Corcovado -à época sem o Cristo Redentor-, de acordo com os pesquisadores.
As observações, segundo seu diário de campo, "limitaram-se quase exclusivamente aos animais invertebrados".
O Ministério de Ciência e Tecnologia montou uma espécie de força-tarefa para identificar os locais por onde ele passou. Seus relatos não fazem referência exata aos pontos visitados, apenas às características naturais do entorno, dificultando o trabalho.
A intenção é marcar os locais com referências feitas em seu diário. O ministério vai lançar ainda um livro com trechos de diários, artigos e cartas em que Darwin se refere ao Brasil.
"O primeiro local onde ele se deparou com a intensidade e diversidade da natureza tropical foi o Brasil. O nosso palco foi privilegiado na construção de uma teoria que é uma das mais importantes da cultura humana", afirmou o diretor do Departamento de Popularização da Ciência e Tecnologia do ministério, Ildeu Moreira.

De floresta a cemitério
A bióloga Sandra Selles e a historiadora Martha Abreu, da UFF, conseguiram identificar há oito anos a estrada por onde Darwin passou e uma casa onde ficou em viagem ao norte do Rio. Segundo elas, Darwin subiu de mula a Serra da Tiririca, em Niterói, acompanhado de outras seis pessoas. Usou a estrada do Vai-e-Vem até chegar à Fazenda Itaocaia.
Em seu diário de viagem, Darwin classificou o local- onde hoje está o Parque Estadual da Serra da Tiririca- como uma "floresta cuja magnificência não podia ser superada".
Mesmo sendo ainda um belo trajeto, a estrada também serve atualmente para "desova" de carros incendiados e até de corpos. O Instituto Estadual de Floresta planeja construir um pórtico para o "caminho de Darwin" e placas pelo trajeto.
"Além da dimensão biológica [da visita de Darwin], a dimensão histórica é importante para valorizar também a preservação do ambiente", disse Selles. Hoje a única marca "histórica" da Fazenda Itaocaia consta no vaso da mesa central da sala: "Fazenda usada nas gravações da novela "Tocaia Grande" da TV Manchete. 1995-1996".
Na Bahia, sabe-se que o hotel Universo, onde se hospedou em Salvador, foi demolido. Ele ficava onde está hoje a praça Castro Alves.


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