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GENÔMICA
Estudo brasileiro associa ação de micróbio a gene
Comparação do DNA de bactérias ajuda a combater pragas agrícolas
REINALDO JOSÉ LOPES
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Duas pedras no sapato da agricultura tiveram seu genoma (o
conjunto dos genes) comparado
por cientistas brasileiros. A dupla
é formada pelas "primas" Xanthomonas citri e Xanthomonas
campestris, duas bactérias que
afetam frutas cítricas e vegetais
como o repolho e a couve-flor.
O trabalho, publicado hoje na
revista científica "Nature"
(www.nature.com), traz dados
importantes sobre as pragas, que
têm em comum cerca de 80% de
seu código genético, mas desenvolveram formas bem distintas de
se aproveitar das plantas.
A mais temida das Xanthomonas é provavelmente a X. citri,
que causa o cancro cítrico e já diminuiu em 25% a produção de laranja no Estado de São Paulo. Mas
a X. campestris, por afetar a Arabidopsis (a planta-modelo da biologia vegetal) e ser muito usada
pela indústria para produzir estabilizantes e lubrificantes, também
deve render resultados .
"Com o genoma, é como se eu
tivesse um livro na mão. Agora é
preciso lê-lo", compara a pesquisadora Ana Claudia Rasera da Silva, do Instituto de Química da
USP, coordenadora do estudo.
"A médio prazo, isso ajuda a
criar mecanismos de combater as
doenças e diminuir a erradicação
das plantações afetadas", afirma.
É que, até hoje, o único jeito de
tratar um laranjal com pés afetados pelo micróbio é arrancar todas as árvores, explica Silva
-uma tática de terra arrasada
que é péssima para o bolso.
"Filogeneticamente [em termos
evolutivos", as duas estão muito
próximas da Xylella", explica Silva, citando outra bactéria parasita
de frutas cítricas cujo genoma foi
sequenciado no Brasil. O estudo
estima algo em torno de 7 milhões
de anos para a separação das duas
espécies, uma ninharia evolutiva
-mas que deixou marcas importantes, diz a pesquisadora. A
maior delas é a adaptação aos diferentes hospedeiros.
"Essas bactérias são muito distintas na hora de atacar cada tipo
de planta", explica Silva. A X. citri
forma uma espécie de tumor (o
cancro) em laranjas e limões. Já a
X. campestris se espalha por todos os tecidos da planta, causando um tipo de apodrecimento.
De acordo com Silva, os genes
explicam esses mecanismos: na
bactéria do cancro cítrico, há diversas sequências de DNA responsáveis por causar uma proliferação exagerada das células, gerando o tumor nas frutas.
A X. campestris, por sua vez, se
especializou em criar enzimas
que rompem a parede celular das
plantas, passando, assim, de tecido a tecido. Os genes que comandam esses mecanismos, identificados e comparados, deverão ser
alvos de pesquisas para deter as
pragas, além de ajudar a identificar quais plantas estão doentes e
poupar as sadias.
O trabalho foi feito por cientistas das três universidades estaduais de São Paulo (USP, Unesp e
Unicamp), além de outros centros no Brasil. O financiamento
veio da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São
Paulo) e do Fundecitrus (Fundo
de Defesa da Citricultura). De
acordo com Silva, mais genomas
de bactérias estão a caminho.
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