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Vetada na UE, cobaia é usada no Brasil
País não cria alternativas para os testes de cosméticos com animais, que serão proibidos pela Europa a partir de 2009
Empresas que podem pagar mais buscam alternativas "in vitro" fora do país; para especialista, legislação precisa ser mais explícita
Eduardo Geraque/Folha Imagem
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Coelho que é usado normalmente para testes de produtos cosméticos em instituto da Unicamp |
EDUARDO GERAQUE
DA REPORTAGEM LOCAL
O Brasil, ao contrário da
União Européia, mostra pouca
preocupação com os animais de
laboratório usados em testes de
segurança de cosméticos. Enquanto na Europa esses experimentos serão proibidos a partir
de março de 2009, aqui não
existem procedimentos alternativos sendo desenvolvidos
em escala comercial.
"Esse é um problema que temos. Não existem testes alternativos em escala comercial no
mercado nacional", afirma Idalina Salgado-Santos, diretora
científica da Evic Brasil. A empresa faz testes para cosméticos para companhias nacionais
na França sem usar animais.
Por isso, afirma, se a lei européia valesse para o Brasil, a Evic
"não teria nenhum problema".
A UE, onde os movimentos
pelos direitos dos animais são
estridentes, já discute o tema
desde o século passado. Ao
mesmo tempo que avançam rumo à proibição, os países europeus também vêm criando alternativas sem animais.
Os parâmetros corrosividade
cutânea e fototoxicidade aguda,
ambos tradicionalmente testados com a aplicação de matéria-prima ou do produto pronto sobre a pele do animal, por exemplo, já foram resolvidos. Já
existem quatro testes alternativos credenciados só para esses
dois itens na UE.
Em um deles, para testar o
poder de corrosão do produto,
as aplicações são feitas sobre
um modelo tridimensional de
pele humana.
No caso da fototoxicidade, o
protocolo deste teste alternativo aprovado pela UE diz que os
experimentos devem ser feitos
sobre culturas de células também da pele, mas de rato.
São vários os parâmetros (características) que precisam ser
testados antes de um produto
chegar às prateleiras, informa a
Anvisa (Agência de Vigilância
Sanitária). Além da corrosão e
do impacto dos raios ultravioleta (fototoxicidade), é preciso
saber ainda se o produto vai
causar irritação nos olhos e nas
mucosas, até genitais se for o
caso. Apesar de não haver regra
nacional sobre os testes, a Anvisa aceita testes alternativos
feitos fora do Brasil.
Alto custo
Entre 1999 e 2002, a União
Européia apoiou 43 projetos de
pesquisa de testes alternativos,
com investimentos totais da
ordem de 80 milhões de euros.
Tudo para tentar evitar o uso
de pelo menos 9.000 animais
todos os anos em testes feitos
exclusivamente para cosméticos. Estimativa idêntica para o
cenário nacional não existe.
No Brasil, as grandes empresas do setor, como Natura e O
Boticário, não usam mais animais em sua cadeia de produção -a primeira desde 2005 e a
segunda desde 2000, segundo
as diretorias das duas companhias, ouvidas pela Folha. Mas
muitos laboratórios fazem testes em animais, inclusive os de
córnea, para os clientes que
não podem ter acesso, muitas
vezes por causa do preço alto,
aos testes feitos na Europa.
Alguns desses laboratórios
são públicos, como o Instituto
Adolfo Lutz de São Paulo - a
assessoria de imprensa do órgão não localizou ninguém para falar sobre os testes. E o
CPQBA (Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas,
Biológicas e Agrícolas) da Unicamp (Universidade Estadual
de Campinas). Um dos coordenadores do órgão, João Ernesto de Carvalho, falou à Folha
.
"Além de antiético é ilegal o
uso de animais em testes para
cosméticos, porque existem alternativas para isso", reclama
Gabriela Toledo, vice-presidente da ONG PEA (Projeto
Esperança Animal). No site da
entidade (www.pea.org.br),
existe uma lista de algumas
empresas que usam e não usam
animais para testes.
"Essa prática ocorre, primeiro por falta de informações ou
de vontade dos laboratórios em
buscar métodos substitutivos
e, em segundo lugar, porque a
utilização de animais é um método menos oneroso", afirma
Toledo, que deixou a faculdade
de veterinária quando era obrigada a utilizar animais.
A mesma opinião tem a especialista em bioética Patrícia Alcântara, da Universidade de
Brasília. "O importante é deixar claro a importância dos testes alternativos na legislação."
A própria UE reconhece que,
para algumas situações, a questão ainda é complexa. Não dá
para saber se um produto será
cancerígeno sem os animais,
por exemplo.
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