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Estado criminaliza estudo da biodiversidade, diz MCT
Burocracia faz cientistas agirem na ilegalidade, segundo coordenadora federal
Legislação que restringe o
acesso dos biólogos do país
aos recursos genéticos seria
inconstitucional, afirma
pesquisadora Ione Egler
RAFAEL GARCIA
ENVIADO ESPECIAL A FLORIANÓPOLIS
"O poder público colocou na
ilegalidade os cientistas que estudam a biodiversidade." Com
essa frase a bióloga Ione Egler,
coordenadora do MCT (Ministério da Ciência e Tecnologia)
para essa área de pesquisa, resume a situação que o setor vive
há quatro anos. Segunda ela,
"uma porcentagem bastante
significativa" dos pesquisadores sofre com o problema desde
que o governo federal endureceu leis as quais, em princípio,
tinham a finalidade nobre de
combater a biopirataria.
O que tem acontecido, porém, é que o CGEN (Conselho
de Gestão do Patrimônio Genético) e outros órgãos do MMA
(Ministério do Meio Ambiente)
demoram demais para apreciar
projetos e não admitem mudanças de rumo após a aprovação. A solução encontrada pelos biólogos foi omitir informações para poder trabalhar.
Egler alertava para o perigo
da "bioburocracia" já em 2002,
quando a medida provisória
2.186 -que estabelece obrigações para aprovação de projetos de pesquisa em biodiversidade- ainda estava sendo discutida. Segundo a bióloga, o volume da ciência feita na área é
grande demais para que o Ibama e o CGEN dêem conta de
fiscalizar toda a atividade. "Isso
é uma tutela da profissão de
biólogo por parte do MMA",
diz. "Existe um ato de inconstitucionalidade nessa matéria."
Egler compara a legislação da
área a situações que seriam impensáveis em outras. "Um dentista não precisa pedir licença
ao Ministério da Saúde para obturar o dente de um paciente",
diz. Ela afirma que um pesquisador reconhecido pelo Conselho Federal de Biologia sabe lidar com questões éticas e não
precisa de policiamento prévio.
"O cientista está muito preocupado, sim, com a perda dos
laboratórios naturais", diz Peter Mann de Toledo, pesquisador do Inpe (Instituto Nacional
de Pesquisas Espaciais) que
coordenou debates sobre o problema na reunião anual da
SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), em
Florianópolis. As discussões no
evento foram incendiadas, na
quarta-feira, pela notícia de
que uma pesquisadora do Museu Goeldi, do Pará, havia sido
intimidada por agentes do Ibama que exigiam documentos
quando transportava uma
amostra de solo. O incidente
motivou uma carta de repúdio
da SBPC, enviada ao MMA.
O secretário de Biodiversidade e Florestas do Ministério do
Meio Ambiente, João Paulo
Capobianco, concorda que a
atual legislação é inadequada,
mas afirma que a simples revogação da MP 2.186 não é a solução correta. "Como membro da
Convenção sobre Diversidade
Biológica, o país precisa de uma
legislação especifica que combata a biopirataria", diz. Segundo Capobianco, já existe um
texto alternativo que alcançou
consenso entre MMA e MCT,
mas o Ministério da Agricultura ainda quer alterações.
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