São Paulo, domingo, 24 de outubro de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Plantio teria facilitado a expansão tupi

Área onde há indícios de agricultura também é considerada berço de povos que colonizariam litoral do país

Cultivo de mandioca tem forte elo com as tribos do grupo, mas evidências mais claras são difíceis de obter

DO ENVIADO A PORTO VELHO

"Tupi or not tupi" (tupi ou não tupi), brincava o poeta brasileiro Oswald de Andrade, parodiando o "to be or not to be" de Shakespeare. No caso das descobertas em Rondônia, a piada do autor modernista está estranhamente próxima da realidade.
Isso porque, ao que tudo indica, o Estado amazônico é considerado por muitos estudiosos como o provável berço da expansão tupi.
É ali que existe a maior diversidade de idiomas do tronco linguístico tupi -e os estudos mostram que essa diversidade só aparece com o tempo. Portanto, é um sinal claro de que os tupis estariam por lá há milênios.
Os povos que falavam idiomas tupis, porém, já tinham se espalhado por uma enorme área, alcançando todo o litoral do Brasil, na época do primeiro contato com os europeus. Seria possível identificá-los como os primeiros plantadores de mandioca do Brasil? Será que isso teria conferido a eles uma vantagem competitiva frente a seus rivais sem lavoura?
Ideias desse tipo ganharam força entre arqueólogos nas últimas décadas. Grosso modo, ocorre que, comparados a caçadores-coletores, povos de fazendeiros têm mais muque demográfico.
Conseguem produzir mais comida para alimentar mais gente no mesmo espaço -algo entre dez e cem vezes mais pessoas por hectare. Por isso, ganhariam a briga por expansão territorial, desalojando ou derrotando em combate seus rivais não-agrícolas.
"Não há dúvida de que há um elo muito forte entre os tupis e o cultivo da mandioca, até do ponto de vista dos mitos sobre a planta que são importantes para eles", diz o arqueólogo Eduardo Bespalez, que tenta relacionar o registro dos sítios com os povos indígenas atuais.
"Encontramos por aqui a cerâmica da chamada tradição policrômica da Amazônia. É comum ela ser associada aos grupos tupis, embora povos sem relação com eles também a tenham produzido", adverte o pesquisador.
Renato Kipnis vê com interesse um possível elo entre avanço demográfico e agricultura, mas diz que os modelos a esse respeito podem acabar sendo simplistas.
"Uma coisa que notamos, com base no próprio sítio Garbin e em outros locais, foram datações em torno de 5.000 anos, as mais antigas depois da de 7.700 anos", conta ele. "O curioso é que essa idade é uma das estimadas para a divergência inicial das línguas do tronco tupi. É uma possibilidade a explorar", afirma o arqueólogo.

PRESERVAÇÃO
Segundo a Santo Antônio Energia, a Universidade Federal de Rondônia terá apoio para montar um acervo preservando os achados dos sítios arqueológicos que foram -ou serão- destruídos pela usina. Outras áreas de escavação, que não serão diretamente afetadas, podem virar áreas de estudo permanente.
(REINALDO JOSÉ LOPES)


Texto Anterior: Marcelo Gleiser: Olhando para o início do tempo
Próximo Texto: Frase
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.