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Papel de nanotubo engorda quando estica
Brasileiros explicam como novo material pode servir para músculos artificiais e coletes à prova de bala
IGOR ZOLNERKEVIC
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Um papel que custe de R$
170 a R$ 5.000 o grama precisa
ter algo de especial para chamar a atenção da indústria e
das forças armadas. Uma equipe internacional de cientistas
descobriu como controlar propriedades elásticas desse papel
que, em vez de fibra de celulose,
é feito de emaranhados de nanotubos de carbono -tubos
com décimos de milésimo da
espessura de um fio de cabelo.
A "folha de papel" no caso é
uma tira retangular de 2 mm
por 12 mm que teve suas deformações elásticas medidas por
microscópio eletrônico.
Os brasileiros da equipe conseguiram entender por que, dependendo da "receita" de fabricação, o papel de nanotubos de carbono se comporta de maneira oposta à de uma tira de borracha normal. O efeito é microscópico, mas surpreende.
Em vez de afinar dos lados
quando esticada, a folha de nanotubos se expande. Em vez de
ficar mais frágil quando comprimida, a folha fica mais dura.
É o que os físicos chamam de
material auxético.
Lee Hall e Ray Baughman, da
Universidade do Texas em Dallas, descobriram em 2006 que
folhas de papel feitas de uma
mistura de dois tipos de nanotubo de carbono podiam se tornar auxéticas.
Canudinhos
Os nanotubos simples são
como canudinhos finos formados por uma folha de átomos de
carbono enrolada, que tendem
a se agrupar em feixes paralelos. O outro tipo são nanotubos
gordos, com dezenas de camadas de carbono concêntricas
enroladas. Acrescentar cada
vez mais camadas acaba tornando o material auxético.
"A mudança nas propriedades elásticas é tão surpreendente, e a estrutura das folhas
de nanotubos de carbono tão
complicada, que achávamos
que uma explicação quantitativa seria impossível", diz Baughman. Vitor Coluci e Douglas
Galvão, da Unicamp, junto com
Sócrates Dantas, da Universidade Federal de Juiz de Fora,
criaram um modelo simples
que explica o comportamento
das folhas de nanotubos, publicado hoje na revista "Science".
Adega nanoscópica
Coluci percebeu que podia
visualizar a "macarronada" de
nanotubos que formam as folhas como uma rede de hastes
se cruzando em ziguezague,
que ele e Galvão comparam a
um engradado de guardar vinhos, feito de hastes flexíveis e
dobráveis. Cada haste é capaz
de se curvar e alongar em reposta a uma tensão mecânica.
Segundo Coluci, "as equações
que regem essa estrutura dizem como ela se deforma quando esticada ou comprimida".
"Os feixes de nanotubos simples se curvam mais facilmente
que os nanotubos múltiplos",
explica Coluci. Assim, no modelo, as barras que representam nanotubos múltiplos são
mais rígidas que as barras representando feixes simples. Se
os nanotubos múltiplos predominarem na mistura, sua rigidez fará com que a folha se expanda em todas as direções do plano quando esticada.
"Outra propriedade importante para aplicações é que, se
você comprime um auxético,
ele vai contrair na outra direção", explica Coluci. "Assim, se
um tecido feito de fibras de nanotubos de carbono for atingido por uma bala, ele vai endurecer no ponto de impacto, protegendo a pessoa vestida por ele,
enquanto o resto do tecido permanecerá flexível." Os pesquisadores do Texas pretendem
justamente tecer fibras de tecido a partir do papel auxético.
Enquanto isso, os brasileiros
realizarão simulações computacionais para descobrir como
moléculas de gás presas no "engradado de vinhos" alterariam
a elasticidade da folha de nanotubos. A idéia é usar o processo
para criar sensores de gases.
Baughman está particularmente interessado em usar as
folhas de nanotubos para fabricar pequenos "músculos" artificiais para robôs. Materiais auxéticos podem servir para ativar uma espécie de nanoalavanca usada no sistema.
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