São Paulo, quinta-feira, 25 de junho de 2009

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Sonda detecta sal de cozinha em Encélado, lua de Saturno

Composto pode indicar existência de um oceano líquido sob superfície de gelo

Análise, feita por grupo europeu com base em partículas emitidas por gêiseres, põe satélite na lista de candidatos à vida

RICARDO MIOTO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Uma das luas de Saturno pode ter um oceano líquido sob sua superfície congelada. Pesquisadores europeus, usando dados da sonda americana Cassini, dizem ter descoberto que há água salgada em Encélado. O sal só se mistura com a água quando ela está líquida.
Esses mares salgados remetem a um ambiente propício ao surgimento e à manutenção da vida como a conhecemos -muito melhor do que a aridez da Lua, por exemplo.
A característica mais bizarra de Encélado é o seu grande jato de água que brota do chão. Ela sai líquida, gasosa e em grãos de gelo. Lembra os gêiseres terrestres - os mais famosos são os de Yellowstone (EUA).
A diferença é que, nessa lua, a água jorra forte de verdade. Ela sobe centenas de quilômetros e se perde no espaço (Yellowstone perde feio, os gêiseres de lá lançam a água a "apenas" algumas dezenas de metros).
Como Encélado só tem 505 quilômetros de diâmetro (a Terra tem mais de 12 mil), a pluma de gelo e vapor mais parece um chafariz perambulando pelo Universo.
A água dessa pluma tem de sair de algum lugar. A esperança dos cientistas era que ela viesse de um grande oceano, permanente e subterrâneo -e não do descongelamento repentino de blocos de gelo, outra hipótese plausível.
Como saber? Uma evidência seria a existência de sal na água. Debaixo de sua crosta de gelo, Encélado, como a Terra, tem rochas. E a água líquida dissolve as rochas quando em contato prolongado com elas, incorporando sais como o cloreto de sódio, o sal de cozinha.
Utilizou-se o fato de que o material dessa pluma também precisa ir para algum lugar. Ele vai se acumulando feito um rastro por onde Encélado passa. Ao longo do tempo, esse rastro se tornou um dos anéis de Saturno -o mais externo de todos, conhecido como Anel E.
Foram utilizados dados da sonda Cassini, lançada em 1997 - e que só chegou a Saturno em 2004. Ela atravessou o Anel E. Os grãos congelados jorrados por Encélado, agora espalhados pelo anel, se espatifavam com brutalidade contra um dos instrumentos da Cassini, que leva o simpático nome de "Analisador de Poeira Cósmica", a 30 mil quilômetros por hora.
Os pesquisadores conseguiram dados, então, sobre a composição química de mais de 3.000 desses grãos. Eles são formados por água e cloreto de sódio, o sal de cozinha. O trabalho foi publicado hoje no periódico científico "Nature".
Na mesma edição, outro grupo, liderado por Nicholas Schneider, da Universidade do Colorado (EUA), analisou, com telescópios no Havaí e na Austrália, o vapor que sai junto com os jatos. Não encontrou sódio.
"Esse outro estudo trata da água que ferve violentamente muito perto da superfície. Como descobriram que não há sódio nela, a reserva líquida salgada deve estar bem mais ao fundo" diz Frank Postberg, do Instituto Max Planck, para Física Nuclear, do grupo europeu.
Além de Encélado, poucos lugares no Sistema Solar podem apresentar água e, consequentemente, vida, ainda que primitiva. Marte e a lua de Júpiter Europa, por exemplo.
Mas Encélado empolga justamente pelos jatos. "Para ter vida é preciso, além de água, calor suficiente. Sabemos que ele existe em Encélado por causa dessas erupções, que são um tipo de atividade vulcânica. Em Europa não há isso", diz a geóloga brasileira Rosaly Lopes, da Nasa, uma das cientistas da missão Cassini.


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