|
Índice
Sonda detecta sal de cozinha em Encélado, lua de Saturno
Composto pode indicar existência de um oceano líquido sob superfície de gelo
Análise, feita por grupo
europeu com base em
partículas emitidas por
gêiseres, põe satélite na
lista de candidatos à vida
RICARDO MIOTO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Uma das luas de Saturno pode ter um oceano líquido sob
sua superfície congelada. Pesquisadores europeus, usando
dados da sonda americana Cassini, dizem ter descoberto que
há água salgada em Encélado. O
sal só se mistura com a água
quando ela está líquida.
Esses mares salgados remetem a um ambiente propício ao
surgimento e à manutenção da
vida como a conhecemos
-muito melhor do que a aridez
da Lua, por exemplo.
A característica mais bizarra
de Encélado é o seu grande jato
de água que brota do chão. Ela
sai líquida, gasosa e em grãos de
gelo. Lembra os gêiseres terrestres - os mais famosos são os
de Yellowstone (EUA).
A diferença é que, nessa lua, a
água jorra forte de verdade. Ela
sobe centenas de quilômetros e
se perde no espaço (Yellowstone perde feio, os gêiseres de lá
lançam a água a "apenas" algumas dezenas de metros).
Como Encélado só tem 505
quilômetros de diâmetro (a
Terra tem mais de 12 mil), a
pluma de gelo e vapor mais parece um chafariz perambulando pelo Universo.
A água dessa pluma tem de
sair de algum lugar. A esperança dos cientistas era que ela
viesse de um grande oceano,
permanente e subterrâneo -e
não do descongelamento repentino de blocos de gelo, outra
hipótese plausível.
Como saber? Uma evidência
seria a existência de sal na água.
Debaixo de sua crosta de gelo,
Encélado, como a Terra, tem
rochas. E a água líquida dissolve as rochas quando em contato prolongado com elas, incorporando sais como o cloreto de
sódio, o sal de cozinha.
Utilizou-se o fato de que o
material dessa pluma também
precisa ir para algum lugar. Ele
vai se acumulando feito um rastro por onde Encélado passa.
Ao longo do tempo, esse rastro
se tornou um dos anéis de Saturno -o mais externo de todos, conhecido como Anel E.
Foram utilizados dados da
sonda Cassini, lançada em 1997
- e que só chegou a Saturno em
2004. Ela atravessou o Anel E.
Os grãos congelados jorrados
por Encélado, agora espalhados
pelo anel, se espatifavam com
brutalidade contra um dos instrumentos da Cassini, que leva
o simpático nome de "Analisador de Poeira Cósmica", a 30
mil quilômetros por hora.
Os pesquisadores conseguiram dados, então, sobre a composição química de mais de
3.000 desses grãos. Eles são
formados por água e cloreto de
sódio, o sal de cozinha. O trabalho foi publicado hoje no periódico científico "Nature".
Na mesma edição, outro grupo, liderado por Nicholas
Schneider, da Universidade do
Colorado (EUA), analisou, com
telescópios no Havaí e na Austrália, o vapor que sai junto com
os jatos. Não encontrou sódio.
"Esse outro estudo trata da
água que ferve violentamente
muito perto da superfície. Como descobriram que não há sódio nela, a reserva líquida salgada deve estar bem mais ao fundo" diz Frank Postberg, do Instituto Max Planck, para Física
Nuclear, do grupo europeu.
Além de Encélado, poucos
lugares no Sistema Solar podem apresentar água e, consequentemente, vida, ainda que
primitiva. Marte e a lua de Júpiter Europa, por exemplo.
Mas Encélado empolga justamente pelos jatos. "Para ter
vida é preciso, além de água, calor suficiente. Sabemos que ele
existe em Encélado por causa
dessas erupções, que são um tipo de atividade vulcânica. Em
Europa não há isso", diz a geóloga brasileira Rosaly Lopes, da
Nasa, uma das cientistas da
missão Cassini.
Índice
|