São Paulo, quarta-feira, 26 de abril de 2006

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MEDICINA

Pesquisadores acusam Banco Mundial de liberar menos verba que o prometido e inflar estatísticas; instituição nega

Bird forja dados sobre malária, diz estudo

DA REDAÇÃO

Para um grupo internacional de pesquisadores, o esforço milionário encabeçado pelo Bird (Banco Mundial) para combater a malária desde o ano 2000 está sendo inflado pela instituição, a qual também utilizaria estatísticas enganosas para ressaltar o sucesso da redução de casos da doença.
A acusação, negada parcialmente pelo banco, foi publicada ontem na revista médica "The Lancet", uma das mais prestigiosas do mundo. A publicação do artigo e da resposta do Banco Mundial foi programada para coincidir com o Dia da Malária na África (o continente é o mais atingido pela moléstia, que mata cerca de 1 milhão de pessoas por ano e afeta hoje por volta de 500 milhões no mundo todo).
"O banco fracassou em ceder à África o financiamento para o controle da malária que tinha prometido e, em vez de admitir isso com clareza, escondeu o fato usando estatísticas pouco transparentes e contraditórias", escreveram os 12 pesquisadores, liderados pelo imunologista e advogado Amir Attaran, da Universidade de Ottawa (Canadá).
Attaran e seus colegas se referem à estratégia global de combate à malária do Bird, uma promessa feita em 2000 aos governos africanos, cuja intenção era investir entre US$ 300 milhões e US$ 500 milhões no combate à doença só na África. No entanto, ao longo dos anos seguintes, as estatísticas do próprio banco mostram uma redução significativa no que realmente foi investido. Os pesquisadores calculam que, na verdade, o crédito ficou entre US$ 100 milhões e US$ 150 milhões.
Além disso, os pesquisadores dizem que o banco não é honesto com os dados sobre os sucessos que esse financiamento conseguiu. No Brasil, por exemplo, o Banco Mundial fala em uma redução de 60% dos casos de malária entre 1989 e 1996, enquanto o Ministério da Saúde considera que a queda foi de cerca de 20%.
Suprotik Basu, especialista-sênior em saúde pública do Bird, disse à Folha que a acusação não procede. "O banco não fabrica estatísticas. Nós retiramos esses dados de um estudo publicado há cinco ou seis anos num periódico especializado por um especialista do Ministério da Saúde do Brasil."

Sobe ou desce?
Mais sério ainda é o caso da Índia: o banco afirmou que seu esforço contra a doença teria ocasionado uma redução de 58%, 98% e 79% nos Estados de Gujarat, Maharashtra e Rajastão, respectivamente, entre 2002 e 2003. Quando os pesquisadores consultaram o governo indiano, foram informados de que a incidência da doença teria aumentado nos três Estados durante o período.
O artigo também acusa o banco de aprovar compras na Índia do antimalárico cloroquina, que consideram obsoleto para o tipo de malária que ataca no país.
Em sua resposta na "Lancet", Jean-Louis Sarbib e seus colegas do Banco Mundial admitiram que o desempenho foi aquém do desejado, mas afirmaram que isso se deveu ao fato de que o Bird se dedicou mais ao combate à Aids na África nesse período.
Ressaltaram que a instituição vai ampliar os recursos já destinados à luta contra a malária na África e no Sudeste Asiático para US$ 500 milhões de dólares no período 2006-2008, "o que está de acordo" com os objetivos inicialmente propostos.
"Claro que eles têm esse plano, mas por que deveríamos confiar neles?"-questionou Attaran.


Com agências internacionais


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