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ASTROFÍSICA
Dupla propõe nova explicação para morte de estrela gigante, contrariando uma idéia consagrada da física
Estudo nega existência de buraco negro
SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL
"Buracos negros não existem."
A frase parece forte demais, mas é
o que dois cientistas dos Estados
Unidos estão dizendo, ao propor
uma explicação alternativa para o
que acontece no fim do ciclo de
vida de grandes estrelas.
A idéia de que os buracos negros -corpos tão densos que sugam tudo o que está à sua volta,
inclusive a luz- eram absurdos
demais para serem reais foi fortemente refutada durante o último
século. E agora que os físicos estão
convencidos de que eles existem,
Pawel Mazur e Emil Mottola querem trazer essa noção de volta.
Além dos velhos argumentos
contra os efeitos bizarros que a
existência desses glutões siderais
acarretaria, a dupla traz na bagagem uma teoria alternativa.
Segundo Mazur, da Universidade da Carolina do Sul, e seu colega, do Laboratório Nacional de
Los Alamos, ambos nos EUA, os
buracos negros dariam lugar aos
astros que eles chamam de "gravastars" (a junção de gravidade
com "star", ou estrela).
"Por fora, eles apresentam as
mesmas características dos buracos negros, mas por dentro são essencialmente diferentes", contou
Mazur à Folha. A diferença é que
as maluquices que incomodam os
astrofísicos há décadas desaparecem com esse novo modelo.
O modelo tradicional de buraco
negro seria o estágio final de vida
de uma estrela maciça. Depois
que ela termina de queimar todo
o seu combustível, ela explode, no
fenômeno conhecido como supernova. O que sobra da estrela
morta começa a encolher violentamente, pela ação da gravidade.
Esse encolhimento segue até
que toda a massa esteja concentrada em um ponto, que apresenta densidade e energia infinitas,
gerando um literal buraco no espaço e no tempo. Nada que cai nele pode retornar ao mundo visível, nem a luz -daí o nome.
Problemas teóricos
A natureza desses objetos foi
prevista por uma das possíveis soluções das equações da teoria da
relatividade, de Albert Einstein.
Mas há diversos problemas teóricos que emergem dessa solução.
Um deles é que ela implica que a
entropia, ou seja, o grau de organização e liberdade de ação que os
componentes da matéria e da
energia possuem -que pelas leis
da física deveria diminuir após a
explosão da supernova- sobe
para um valor estratosférico.
"Em um buraco negro, a entropia sobe 20 ordens de grandeza,
saltando de 1057 [o número um seguido de 57 zeros" para 1077, quando na verdade deveria diminuir",
disse Mazur. "Já em uma gravastar, ela iria de 1057 para 1038, um
número bem mais razoável."
A idéia da gravastar também é
uma solução possível das equações de Einstein, uma bem próxima da que prevê um buraco negro. A diferença é que na mais antiga um importante fator, a constante de Planck (o número que
determina quanta energia uma
partícula pode carregar) era zero.
"Acontece que sabemos que a
constante de Planck não pode ser
zero. Por isso, na vida real os buracos negros não existem", afirmou Mazur, um polonês radicado nos Estados Unidos.
Diferenças e semelhanças
A gravastar produziria muitos
dos sinais que hoje são interpretados como indícios de um buraco
negro, como a grande emissão de
radiação. A diferença é que ela
não tem as mesmas características absurdas (veja o quadro à dir.)
Em seu lugar, haveria um objeto
com uma superfície ultradensa,
capaz de interagir com o resto do
Universo. Quando partículas se
chocassem com ele, emitiriam
uma radiação especial. Segundo
Mazur, ela poderia ser detectada.
"Os que se mostraram mais interessados pelos nosso resultados
foram os astrofísicos observacionais", afirma. "Em duas semanas
vou estar com um pessoal do ESO
[Observatório Europeu do Sul",
dando palestras sobre o assunto.
Eles estão querendo ver se é possível detectar essa "assinatura"."
No interior da casca ultradensa,
a matéria mudaria de estado, se
convertendo no que os cientistas
conhecem como condensado Bose-Einstein -um estado da matéria tão organizado que todas as
suas partículas se comportam como se fossem uma só.
O estudo de Mazur e de Mottola
foi submetido à prestigiosa revista
"Physical Review Letters" e está
atualmente em revisão. Pode ser o
começo de uma reviravolta na
idéia que os físicos têm dos buracos negros. Ou, pelo menos, é no
que a dupla acredita.
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