|
Texto Anterior | Índice
ASTRONOMIA
Brilho máximo de corpo celeste na constelação do Unicórnio tem propriedades inexplicáveis por teoria atual
Hubble mostra eco de novo tipo de estrela
SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL
A princípio, parecia que os astrônomos estavam enxergando
chifre em cabeça de cavalo. Mas é
verdade: uma estrela localizada
na constelação do Unicórnio está
desafiando todas as teorias de
evolução estelar já concebidas.
"Isso é absolutamente correto,
não há nada que explique o comportamento dessa estrela em nossos modelos", diz Sumner Starrfield, pesquisador da Universidade Estadual do Arizona, nos EUA,
um dos autores da pesquisa.
Tudo começou em janeiro de
2002, quando o discreto objeto
conhecido como V838 Monocerotis começou a sofrer uma intensificação violenta de seu brilho.
No pico do processo, tornou-se
600 mil vezes mais brilhante que o
Sol, e a estrela mais brilhante de
toda a Via Láctea. "Essa estrela teve seus 15 minutos de fama", diz
Anne Kinney, diretora do programa de astronomia e física da Nasa
(agência espacial americana).
Quando isso aconteceu, a V838
chegou até a ser visível com o auxílio de um pequeno binóculo,
apesar de sua distância respeitável
da Terra -o valor exato ainda
não foi precisado, mas ela está no
mínimo a 19,5 mil anos-luz daqui
(um ano-luz equivale a cerca de
9,5 trilhões de quilômetros).
Hoje, só com um telescópio poderoso ela pode ser observada. E o
grupo liderado por Bond -Howard Bond, do Space Telescope
Science Institute, usou o melhor
equipamento disponível: a nova
câmera ACS do telescópio espacial Hubble. Pelo visto, valeu a pena. "As imagens nos deixaram de
queixo caído", diz Starrfield.
O principal elemento da observação é um chamado "eco de luz"
-raios luminosos que partiram
no momento da explosão de brilho da estrela, mas chegaram atrasados aqui com relação aos demais, por terem ido em outra direção e então rebatidos por poeira
em torno da estrela, fazendo um
percurso total maior até a Terra.
A sequência de imagens (veja-as
abaixo, à direita) revelou que o
objeto, na verdade um sistema binário (composto por dois corpos), é incomum. A explosão de
brilho lembra uma supernova
-evento que ocorre no estágio final de vida de estrelas mais maciças ou quando uma dela reage
violentamente após passar anos
deglutindo a massa de sua estrela
companheira-, mas nenhuma
foi vista com essa configuração.
Pior, nenhum modelo consegue
explicá-la a contento. "Eu trabalho justamente na modelagem
computacional de estrelas", diz
Starrfield. "Fiz várias tentativas,
mas não vou falar delas, porque
simplesmente deram errado. Não
conseguimos até agora fazer uma
estrela se comportar desse jeito no
computador", afirmou.
"Pois é, V838 Monocerotis parece ser um exemplar único no
zôo cósmico", diz Augusto Damineli, do Instituto de Astronomia,
Geofísica e Ciências Atmosféricas
(IAG) da USP. "Ela seria aparentada com as novas recorrentes.
Entretanto, diferentemente delas,
a estrelas "normal" do sistema seria uma azul, em vez de uma estrela fria de costume, e a companheira não parece ser uma anã
branca." Mesmo sendo uma azul,
ela poderia ter a aparência temporária de uma gigante vermelha
-o que os americanos observaram- em razão das reações causadas pela súbita transformação
da estrela, segundo Damineli.
"Estamos tendo dificuldade para entender a explosão, que não
mostrou um comportamento
previsto pelas teorias atuais de explosões de nova", diz Bond. "Ela
pode representar uma rara combinação de propriedades estelares
que nunca vimos antes."
Damineli acha que as respostas
emergirão. "Essa estrela parece
ser uma nova, mas com um comportamento exuberante, não encontrado antes", afirma. "Hoje ela
parece um caso à parte, mas daqui
a algum tempo pode ser que se
descubra que ela é apenas um
exemplar de uma classe inteira de
objetos." Por enquanto, o mistério persiste.
Texto Anterior: Biotecnologia: Empresa de cientistas vai melhorar cana-de-açúcar Índice
|