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ECOLOGIA
Instalação na Bahia criará machos estéreis para controle biológico de principal praga da fruticultura no semi-árido
Fábrica produzirá mosca para agricultura
DA REDAÇÃO
A cidade de Juazeiro, na Bahia,
deverá assistir em 2005 à inauguração de uma indústria cujo produto faria muita gente se arrepiar
de nojo: milhões de moscas por
semana. Os insetos serão usados
no controle biológico de uma praga que rouba até R$ 80 milhões
por ano da fruticultura brasileira.
A mosca-do-mediterrâneo, ou
moscamed (Ceratitis capitata), é
natural da África e foi introduzida
no Brasil no século 19. Estima-se
que cause no mundo todo um
prejuízo de US$ 2 bilhões por ano.
Extremamente adaptada, ela
põe seus ovos em frutos de 200 espécies de planta. "Essa é a mosca
do bicho da goiaba", disse à Folha
Aldo Malavasi, do Instituto de
Biociências da USP.
Malavasi é o diretor da Moscamed Brasil, a primeira biofábrica
nacional, sediada em Juazeiro e
hoje em fase de instalação. Com
investimento de R$ 5 milhões do
governo da Bahia e R$ 17 milhões
divididos entre a Finep (Financiadora de Estudos e Projetos) e os
ministérios da Agricultura e Integração Regional, a fábrica deverá
produzir, a partir de abril de 2005,
cerca de 200 milhões de machos
estéreis da mosca por semana.
A idéia é "pulverizar" os pomares da região Nordeste -principal produtora de frutas tropicais
do país- com os insetos estéreis,
para que eles realizem o controle
biológico da mosca.
"A idéia é fazer uma supressão
populacional", diz Malavasi. Traduzindo: como erradicar a praga é
muito difícil, o controle biológico
tem como objetivo reduzir a população das moscas nos pomares
a ponto de elas não causarem prejuízo econômico. Isso é possível
graças às peculiaridades do comportamento sexual da praga.
"Diferentemente dos seres humanos, as moscas não aceitam
cópula a qualquer momento", explica Malavasi, 52. As fêmeas possuem um compartimento no abdômen chamado espermateca,
onde os espermatozóides do macho ficam estocados por até 15
dias depois da cópula. Enquanto
ela não esvazia a espermateca,
não faz sexo outra vez.
É aí que entram os machos estéreis. Quando em fase de larva, eles
recebem uma dose de radiação
que faz com que produzam espermatozóides inviáveis.
Soltos na natureza, eles passam
a procurar as fêmeas e a encher
suas espermatecas com os gametas inúteis. "Ela continua pondo
ovos, mas ovos não-fertilizados",
afirma o pesquisador da USP.
Se a quantidade de machos estéreis liberada for maior que a população de machos sadios -o
que se acredita ser o caso no semi-árido brasileiro-, a população
pode ser suprimida em aproximadamente 11 gerações.
A eficiência da técnica aumenta
com o tempo: no começo, o declínio populacional é de apenas 5%,
mas vai crescendo à medida que
novos machos são introduzidos e
menos ovos viáveis são postos.
Segundo Malavasi, com liberações contínuas dos machos, é
possível erradicar a praga de regiões isoladas em até um ano.
Cada milhão de moscas estéreis
da fábrica custará R$ 170, 30%
menos que os pesticidas convencionais, à base de organofosforados -que ainda por cima deixam
resíduos. "É ambientalmente correto e socialmente justo, já que as
moscas também voarão por pequenas propriedades em busca de
fêmeas", diz o biólogo.
A Moscamed deverá, ainda, "fabricar" as lagartas Cydia pomonella, que vieram da Argentina e
atacam as lavouras de maçã do
Sul. O clima quente de Juazeiro
impede que esses insetos escapem para o ambiente.
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