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Desnutrição da mãe deixa marcas no DNA da criança
Estudo analisou holandeses gerados durante embargo de comida na 2ª Guerra
Conseqüências práticas da descoberta são ignoradas; estudo mostra que início de gravidez pode determinar traços genéticos da pessoa
EDUARDO GERAQUE
DA REPORTAGEM LOCAL
As condições do ambiente
são determinantes para a história genética dos indivíduos,
mesmo ainda dentro do útero
materno. Mais uma prova disso
vem de um estudo feito com o
material genético de pessoas
que nasceram na Holanda no
fim da 2ª Guerra Mundial,
quando o país passava por um
embargo de comida imposto
pelos alemães entre dezembro
de 1944 e junho de 1945.
Cientistas dos EUA e da Holanda avaliaram o DNA de 122
pessoas. Metade do grupo estava no início da fase uterina
quando o embargo começou
(nasceram durante o embargo
ou logo depois). Os dados deles
foram comparados com os de
seus irmãos, que não foram gerados nem nasceram no período de racionamento.
O resultado obtido no estudo, publicado hoje na revista
"PNAS", mostra que a falta de
comida, nos primeiros meses
de gestação, altera o material
genético dos filhos. Nenhum
deles, porém, nasceu abaixo do
peso ou com algum problema
evidente de saúde.
As análises mostraram que o
gene IGF2 (fator de crescimento semelhante à insulina 2) dos
holandeses que tiveram, nos
anos 1940, suas mães expostas
à privação de alimento, passou
por um processo chamado pelos cientistas de alteração epigenética, que é diferente de
uma mutação tradicional.
"É a prova, mais uma vez, de
que o ambiente tem um poder
muito grande sobre os nossos
genes", disse à Folha o pesquisador Lambert Lumey, do Instituto de Psiquiatria do Estado
de Nova York e da Universidade Columbia, principal autor
do estudo da "PNAS".
O gene IGF2 dos fetos cujas
mães passaram fome sofreu a
perda de radicais de metila
(CH3). A metilação (quando o
grupo metila está preso ao
DNA) é importante porque ela
ajuda a silenciar genes que podem ser indesejáveis.
No caso do IGF2, quando ele
deixa de ser silenciado -a metilação sempre ocorre na cópia
herdada da mãe-, o potente fator de crescimento que ele sintetiza pode ficar mais disponível no organismo.
A conseqüência imediata
desse processo é que o produto
do IGF2 pode servir de combustível para o desenvolvimento de tumores no futuro.
"Nossa grande pergunta agora é tentar entender como essa
baixa metilação causada pela
exposição ao racionamento de
comida pode interferir na vida
real dessas pessoas", afirma
Lumey. A relação com o câncer, até agora, é apenas teórica.
O estudo feito com os holandeses, todos com mais de 60
anos hoje, não mostrou relação
entre mudanças epigenéticas e
a falta de comida no período final de gestação. "Isso reforça a
tese de que o estágio inicial do
desenvolvimento dos mamíferos é crucial para a manutenção de marcas epigenéticas."
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