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RUMO AO ESPAÇO
Marcos Cesar Pontes decola às 23h29 de base no Cazaquistão rumo à Estação Espacial Internacional, onde ficará por oito dias
Brasileiro parte para o espaço hoje à noite
SALVADOR NOGUEIRA
ENVIADO ESPECIAL A BAIKONUR
O astronauta Marcos Cesar
Pontes já pode se dizer completamente pronto para a missão. Anteontem, no Centro de Lançamento de Baikonur, ele recebeu a
última sessão de instruções para a
condução dos experimentos programados em sua visita à ISS (Estação Espacial Internacional).
Hoje, às 23h29 (hora de Brasília),
ele decola rumo à estação.
Pontes havia recebido instruções para sete dos oito experimentos nacionais durante seu
treinamento em Moscou. O oitavo, chamado NIP (Nuvens de Interação Protéica), ainda carecia
das devidas explicações, que agora foram finalmente transmitidas
em Baikonur, Cazaquistão, por
um grupo encabeçado por um
dos criadores do experimento,
Aristides Pavani, do Centro de
Pesquisas Renato Archer, em
Campinas, interior paulista.
O NIP é o experimento que mais
exigirá de Pontes. Ele envolve a
observação de reações de proteínas bioluminescentes, entre elas
as responsáveis pela luz que emana do traseiro dos vaga-lumes, em
uma câmara fechada.
De todos os experimentos nacionais embarcados na chamada
Missão Centenário, o NIP é o menos convencional. Além de sua
natureza científica, o projeto também envolverá um lado estético
-é o primeiro experimento a ser
realizado no espaço que foi desenvolvido numa parceria entre pesquisadores e artistas.
É o único dos oito que mereceu
atenção e admiração manifesta
dos russos. "Os experimentos
brasileiros em geral já foram realizados no âmbito dos programas
russos, europeu e americano",
disse Sergei Ferlov, responsável
pela avaliação de segurança nos
experimentos envolvendo aspectos biológicos na empresa RSC
Energia (pronuncia-se "Enérguia"), companhia que fabrica os
foguetes e as naves Soyuz.
"Mas há um experimento, chamado NIP, que é bem interessante. Tecnicamente, ele foi desenhado de uma forma original."
Quando perguntado se os pesquisadores
russos tinham
interesse em
também analisar os resultados obtidos
pelo experimento brasileiro, Ferlov
se saiu com
uma boa.
"Não queremos comer o
bolo deles",
brincou.
O NIP também é o experimento que
mais exige do astronauta.
"O Marcos terá de fazer todos os
ajustes, realizar o experimento,
ver se ficou bom, fazer de novo, se
sentir necessidade", disse Pavani.
"E o comandante [Pavel Vinogradov] também terá de participar.
Sua função será registrar o Marcos realizando o experimento."
Esse registro será importante
para avaliar o desempenho e o
que pode ser melhorado para a
condução dos testes em órbita.
Com a finalização das instruções sobre os experimentos, o
único impedimento que poderia
se interpor entre Pontes e sua viagem espacial é a saúde. Mas não
vai acontecer, segundo Luiz Claudio Luttis, médico da Aeronáutica
que acompanha o brasileiro.
"Ele já está bem para o vôo, não
vai passar por mais nenhum exame", disse o médico. "Deve apenas passar por umas medições
para controle de perda de peso
durante a missão. Mas ele está ótimo, apenas ansioso para voar."
De acordo com Luttis, Pontes
deve perder cerca de três quilos
em sua missão, mas isso se deve
principalmente à redistribuição
de líquidos no corpo num ambiente sem sensação de peso.
O período previsto de recuperação para o astronauta brasileiro
na Cidade das Estrelas, em Moscou, é de cerca de duas semanas.
O foguete que levará Pontes ao
espaço também já está pronto.
Ontem ele fez sua primeira viagem, de trem: um trajeto de cerca
de três quilômetros até sua plataforma de lançamento. O procedimento de transporte do enorme
lançador tomou boa parte da manhã de terça-feira em Baikonur.
Trenzinho cazaque
O gigante foi tirado do prédio
em que é montado às 7h. Mais
uma tradição russa estava em andamento: foi nessa mesma hora,
em 1961, que o foguete de Yuri
Gagarin foi retirado para o transporte para a plataforma -a mesma que será usada agora.
Na época, havia uma justificativa para o horário. Como o antigo
programa soviético era totalmente secreto, era melhor realizar o
procedimento enquanto ainda estava escuro -o céu é negro às 7h
em Baikonur nesta época.
Hoje, o motivo é apenas manter
uma tradição que deu sorte desde
o início. E, claro, dar tempo para
que o foguete passe por suas últimas checagens e abastecimento.
O foguete leva o nome de Soyuz-FG, versão mais recente dos
velhos lançadores R-7, que têm
servido religiosamente os russos
em suas investidas no espaço desde a decolagem do Sputnik, primeiro satélite artificial, em 1957.
Trata-se de um monstrengo de
39 metros de altura, composto
por três estágios ("andares").
Queimando um "andar" por vez e
descartando-o assim que o combustível dele acaba, reduz-se a
massa total que precisa continuar
a ser empurrada para cima, aumentando a eficiência.
Com isso, é possível atingir uma
órbita terrestre baixa, que exige
uma velocidade de aproximadamente 28 mil quilômetros por hora, e chegar à ISS, que agora orbita
a Terra a cerca de 350 km de altitude. Para realizar a proeza, o foguete queima pouco menos de
200 toneladas de combustível
-uma combinação de querosene
e oxigênio líquido.
Mas, de tudo que deixa a Terra,
a única coisa que chega realmente
ao final da viagem é a pequena nave Soyuz TMA-8, com sete metros
de comprimento -e três tripulantes a bordo, incluindo Pontes.
Reservas
A contagem regressiva começou até mesmo para quem não vai
voar. Ao trio de astronautas reservas que substituiria o russo Pavel
Vinogradov, o americano Jeffrey
Williams e o brasileiro Marcos
Cesar Pontes, coube ontem o privilégio de poder testemunhar o
posicionamento do lançador que
levará os titulares.
Fiódor Yurtchikhin, substituto
de Vinogradov, foi quem melhor
definiu a sensação. "É como se você tivesse um terno Versace e então não pudesse usá-lo."
Michael Fincke, substituto de
Jeffrey Williams, até arriscou a falar algumas palavras em português, concluindo com um entusiástico "Viva Brasil!"
Já ao russo Sergei Volkov coube
a ser o substituto de Pontes. Ele
conta que o brasileiro conquistou
a simpatia dos russos, que vêem
em seu sorriso algo de outro pioneiro do espaço: Yuri Gagarin.
NA TV: Bandeirantes,
Cultura, Globo, Record e
RedeTV!, ao vivo, 23h29
www.folha.com.br/060871
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