São Paulo, quarta-feira, 29 de maio de 2002

Próximo Texto | Índice

ESPAÇO

Volume de gelo detectado por sonda americana a menos de um metro sob o solo recobriria o planeta, se derretido

Marte possui água abundante e acessível

SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Finalmente a Nasa pôs um ponto final em um dos mais duradouros mistérios de Marte, o destino dos oceanos que uma vez existiram em sua superfície. A resposta é: para baixo. Há gelo suficiente no subsolo marciano para recobrir toda a superfície do planeta com água, se derretido.
A informação veio da órbita marciana, diretamente da sonda Mars Odyssey, a nova preciosidade da agência espacial dos EUA. Resultados preliminares obtidos pela sonda já haviam sido divulgados pela Nasa no início de março, mas só agora surgem os primeiros estudos científicos.
A idéia inicial era divulgá-los na quinta-feira, coincidindo com uma entrevista coletiva em Washington e com sua publicação on-line pela revista científica "Science" (www.sciencexpress.org), mas a divulgação acabou sendo antecipada depois de um bafafá iniciado pela imprensa britânica.

Noção antiga
A idéia de que deve haver um bocado de água em Marte já é antiga e vem sendo confirmada seguidamente por observações. Formações no solo observadas primeiro pelas sondas Viking, em 1976, e depois pela Mars Global Surveyor, em 1997, indicavam que correntes líquidas deviam ter banhado boa parte da superfície bilhões de anos atrás.
Em 1999, a mesma Global Surveyor demonstrou que boa parte da capa de gelo no pólo norte marciano é composta por água congelada. No ano passado, pesquisadores reportaram várias evidências de presença de água em estado líquido relativamente recente (alguns milhões de anos de idade) no solo marciano.
Mas agora é diferente. "Pela primeira vez temos um mapa detalhado da localização da água no subsolo de Marte. E estamos de fato vendo a água, não seus traços", diz Jeffrey Plaut, um dos cientistas que trabalham na missão Odyssey no JPL (Laboratório de Propulsão a Jato), da Nasa.
O mapeamento mostra que a água se concentra mais nas proximidades dos pólos norte e sul, mas também marca alguma presença em outras regiões do planeta (veja quadro à direita).

Presença de água -ou não
O que os instrumentos da Odyssey são capazes de detectar não é a água em si, mas um de seus componentes -o hidrogênio. Em tese, esse hidrogênio poderia fazer parte de outro composto, que não a água, mas ninguém acredita nessa hipótese. "Não podemos afirmar com certeza, mas é difícil imaginar outra forma de explicar as medições", diz Plaut. "Hidrogênio puro é instável, e a concentração que observamos é muito alta para ser outra coisa que não água. Além do mais, os lugares em que o detectamos são compatíveis com os que, nos modelos, permitiriam a presença de gelo de uma maneira estável."
Os instrumentos têm uma limitação, no entanto. Só são capazes de detectar hidrogênio a até um metro abaixo da superfície. Plaut afirma que, somada, a água que os pesquisadores da Nasa detectaram poderia recobrir Marte com um oceano de cerca de dez centímetros de profundidade.
Entretanto, se a concentração de gelo no solo a até um metro se repetir a profundidades maiores, seu volume seria o suficiente para inundar a superfície marciana com 0,5 km a 1,5 km de água, aponta um dos três estudos sobre o assunto na "Science".

Fácil acesso
"O mais importante", diz Plaut, "é que a água parece estar facilmente acessível e sabemos onde encontrá-la." Essa informação pode teleguiar as próximas missões ao planeta vermelho de modo a otimizar os resultados.
Acredita-se, por exemplo, que a água seja o precursor fundamental para vida. Se alguém deseja procurar por bactérias marcianas e não estiver satisfeito com meteoritos velhos caídos ao acaso na Terra, poderia muito bem enviar uma sonda para escavar uns poucos centímetros no solo marciano e analisar uma amostra de gelo.



Próximo Texto: Vôo tripulado ainda demora, afirma a Nasa
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.