|
Próximo Texto | Índice
Físicos da USP acusam diretor de plágio
Grupo de professores diz que chefe do Instituto de Física copiou artigos de colegas; episódio abre crise entre docentes
Cientista reage dizendo que
colega também publicou
trechos copiados de outros
autores; sindicância na
reitoria fará investigação
RAFAEL GARCIA
DA REPORTAGEM LOCAL
Uma acusação de plágio que
envolve artigos científicos assinados pelo diretor do IF (Instituto de Física), da Universidade de São Paulo, Alejandro
Szanto de Toledo, abriu ontem
uma crise entre os professores
da entidade. A denúncia, que
circula internamente entre um
grupo de físicos desde abril,
aponta entre os artigos plagiados dois trabalhos do professor
Mahir Hussein, da própria
USP, recém-aposentado.
Um artigo publicado pelo
grupo de Szanto na revista
"Physical Review C" está sendo
investigado por plágio, e outro
na "Nuclear Physics A", foi retratado (anulado). Um terceiro,
na "Physics Letters B" é questionado por seus colegas.
As denúncias contra Szanto
foram encaminhadas à Reitoria
da USP. "Será montada uma comissão e tudo será apurado
com todo o cuidado", disse à
Folha Mayana Zatz, pró-reitora de Pesquisa. Ela descartou a
hipótese de Szanto ser afastado
temporariamente antes disso.
"Não é o procedimento tomar
uma atitude de cara."
Szanto reagiu ontem à acusação, reconhecendo "erros de
referenciamento", mas dizendo que o artigo foi submetido
para publicação sem seu conhecimento por outro integrante de seu grupo. Hussein
rejeita a explicação: "Se isso
não é plágio, então eu não sei o
que é plágio", diz.
O diretor se diz perseguido.
"Não sou o autor principal desse artigo, não sou o orientador
do trabalho desse artigo, mas
sou a pessoa visada", disse. "Tudo isso aqui é uma ação política,
não tem nada de acadêmico."
Sua outra estratégia de defesa foi o ataque. Ontem, numa
reunião de docentes do IF ,
Szanto apresentou em público
trechos de um artigo de Hussein que apontavam trechos
copiados de outros trabalhos.
"Não o acusei de nada, apenas
mencionei que ele esqueceu o
referenciamento."
O episódio de ontem foi o
ápice de uma escaramuça que
se iniciou logo que a denúncia
do plágio cometido pelo grupo
de Szanto aflorou. Professores
do IF ouvidos pela Folha afirmam que, em um primeiro momento, o diretor prometeu
apurar o caso internamente,
mas depois tentou criar barreiras à apuração.
Szanto teria tentado encerrar o assunto após atribuir toda
a culpa a um único membro de
seu grupo, convencendo-o a escrever uma carta de retratação
à revista "Physical Review C",
que publicou o estudo questionado. A Folha teve acesso ao
documento, assinado pelo físico Nelson Carlin, do grupo de
Szanto. "Gostaria de deixar claro que sou o único responsável
pela redação e submissão desse
artigo" escreveu Carlin. O pesquisador não foi encontrado
em sua sala ontem à tarde,
quando a Folha o procurou.
Ameaça
O físico Élcio Abdalla, chefe
do departamento em que Hussein trabalha, diz que sofreu
uma ameaça de retaliação
quando ele e outros colegas
tentavam encaminhar o caso
para apuração na reitoria. "Ele
[Szanto] disse para mim que tinha uma caixa de Pandora",
afirmou. A retaliação seria a revelação de um dossiê "de 10 a 15
centímetros de espessura" onde afirma que há sete professores do IF envolvidos em cópias
de trechos de trabalhos.
Abdalla enviou ontem uma
carta à Reitoria pedindo, então,
que a contradenúncia também
fosse apurada. "No caso de o
dossiê não existir fica caracterizada uma denúncia vazia", diz.
Além da Reitoria da USP, o
CNPq (Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e
Tecnológico), responsável pela
concessão de bolsas a cientistas, também confirmou que está apurando o caso, mas não se
pronunciará por enquanto.
A entidade periodicamente
contabiliza a quantidade de artigos publicados por cientistas
para avaliar quais merecem receber bolsas de mérito por alta
produtividade. Estudos retratados (anulados) por problemas de plágio ou desvios éticos
não entram na conta.
Benjamin Gibson, editor da
"Physical Review C", disse à
Folha que não pode revelar
ainda o que será feito do estudo
questionado, pois o processo na
revista é confidencial.
O grupo de Szanto, porém, já
teve um estudo retratado na revista "Nuclear Physics A". A revista não diz qual
foi o motivo da retirada -mas
declara que seus casos de retratação se aplicam a "violações de
códigos éticos profissionais".
Szanto afirma que o artigo foi
anulado a seu pedido. "Quem
retratou o artigo fomos nós, os
autores", diz. Mais uma vez,
disse, um integrante de seu
grupo teria redigido e enviado
um trabalho a uma revista sem
consultar os colegas de grupo.
Aposentadoria
Hussein, ouvido ontem pela
Folha, diz que as justificativas
de Szanto para negar a acusação não o convenceram.
Iraquiano naturalizado brasileiro e professor da USP desde os anos 1960, Hussein pediu
aposentadoria nesta semana,
"para conseguir continuar trabalhando". Antes de a controvérsia tomar proporção, o professor chegou a pedir ao diretor
a permissão para manter uma
sala no instituto. O pedido foi
negado depois disso. Em julho,
Hussein viaja para um período
de trabalho na Alemanha.
"Ele diz que se compromete a
[continuar a] administrar aulas, que é uma exigência regimental para esses casos, só que
ele vai estar no exterior", diz
Szanto. "Como ele pode dar aula se vai estar no exterior?"
Próximo Texto: Frases Índice
|