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FÍSICA
Grupo emite pulso de raios X com quintilionésimos de segundo, tempo em que só um tipo de partícula parece mover-se
Técnica quebra recorde e flagra elétrons
SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL
Alguns cientistas deixaram a
classe dos fotógrafos com inveja
hoje, convencendo átomos a posar para eles. Eles divulgaram um
jeito de tirar "fotos" (na verdade,
medir propriedades) de átomos
como se estivessem parados, desafiando o passar do tempo.
A estratégia deve abrir um novo
campo de pesquisa, a chamada attofísica -responsável por estudar coisas que se movem em escalas de tempo medidas em attossegundos. Um attossegundo é um
jeito chique de dizer "um instante". Equivale a um quintilionésimo (ou 0,000000000000000001)
de segundo. Se ele fosse um segundo, um segundo seriam 32 bilhões de anos -mais que o dobro
da idade do Universo.
Nessa escala é possível, por
exemplo, ver os elétrons se moverem em torno dos núcleos atômicos, enquanto todo o resto da matéria parece estar estacionado.
Sondar propriedades de partículas, como prótons, nêutrons e
elétrons, é algo que só pode ser
feito quando se lança sobre elas
um certo feixe, normalmente feito
de fótons (as partículas que compõem a radiação eletromagnética,
cujo padrão mais popular é o da
luz visível). É a interação dos fótons com a partícula a ser estudada que fornece a medição.
Para observar movimentos cada vez mais rápidos, é preciso ter
feixes de luz cuja duração também seja cada vez menor. E a duração mínima de um disparo se
relaciona com seu comprimento
de onda. Essa medida determina
que tipo de radiação está sendo
emitido (além de luz visível, outras variedades famosas são infravermelho, ultravioleta e raios X).
Foi aí que os cientistas toparam
com um problema. Eles até conseguiam emitir um feixe com
comprimento de onda bem curto,
mas não conseguiam ao mesmo
tempo dispará-lo apenas por um
minúsculo período de tempo.
Eis que entrou em cena a equipe
chefiada por Ferenc Krausz, da
Universidade de Tecnologia de
Viena, na Áustria, publicada hoje
na "Nature" (www.nature.com).
A solução dele e de seus colegas é
muito mais uma questão de engenhosidade do que de tecnologia.
Para perscrutar coisas na attoescala, eles puseram a natureza para
trabalhar para eles. O pulso que
emitiram não era nada inovador
-um laser de luz visível com duração de femtossegundos, mil vezes mais que os cobiçados atto.
Só que, ao atingir uma nuvem
de átomos de neônio, o pulso induziu a geração de um outro disparo a partir dela, esse sim no formato de raios X e na mesma direção que o original -só que com
duração de 650 attossegundos.
Bom, mas não o bastante
A pesquisa conseguiu romper a
barreira dos femtossegundos ao
fazer medições de propriedades
de uma nuvem de átomos de criptônio. Mas ainda não tem rapidez
suficiente para observar bem o
movimento dos elétrons.
"Esse movimento pode acontecer numa escala de tempo tão curta quanto poucas dezenas de attossegundos, uma ordem de magnitude menor que a que demonstramos", disse Krausz à Folha.
"Ainda há muito a ser feito."
Mesmo assim, o pesquisador
aposta que eles abriram uma porta que não será fechada tão cedo.
"Estamos confiantes de que esses
resultados vão disparar atividades
de pesquisa em um vasto número
de laboratórios no mundo todo e,
por isso, o progresso até uma tecnologia estabelecida será rápido.
Digamos, um, dois anos."
Para Yaron Silberberg, cientista
do Instituto Weizmann de Ciência (Israel) que comentou o estudo para a "Nature", o próximo
passo agora "deve ser melhorar a
técnica para que possa ser usada
para praticar um pouco de física
real -entender algo novo".
Ou, como Krausz coloca, descobrir "quantos segredos a natureza
ainda guarda e o quanto devemos
lutar para desvendar esses segredos e sermos capazes de fazer a
natureza trabalhar para nós". E
ele conclui poeticamente: "Há trabalho mais bonito que esse?"
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