São Paulo, sexta-feira, 30 de janeiro de 2004

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MEDICINA

Experimento com camundongos consegue reunir dois ingredientes da planta que matam só as células cancerosas

Israel cria "míssil" de alho contra tumores

RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL

Juntando os princípios por trás da guerra química e da bomba inteligente, cientistas do Instituto Weizmann, de Israel, conseguiram derrotar tumores usando uma substância tirada do alho.
A alicina é a substância contendo enxofre que dá o aroma típico do alho. Ela é um meio de defesa da planta que se forma apenas quando ela está sendo atacada por um parasita (ou quando um cozinheiro esmaga um dente de alho), constituindo uma forma de guerra química natural.
A planta contém duas substâncias, aliinase e aliína, armazenadas separadamente. Em contato, quando as membranas que as isolam são rompidas, formam a alicina. É o mesmo princípio das chamadas armas químicas binárias, nas quais um produto letal se forma a partir de dois outros isoladamente inertes.
Os cientistas já conheciam os efeitos tóxicos da alicina, capaz de matar micróbios e até células normais. Felizmente para quem come, a alicina se decompõe rapidamente em substâncias inofensivas. Mas essa mesma propriedade impedia o desenvolvimento de algum remédio com base nela, apesar de a alicina ter sido descoberta em 1944 e seus efeitos serem conhecidos há 50 anos.
Os pesquisadores israelenses procuraram fazer o mesmo que a planta: juntar aliinase com aliína para formar a alicina nas células cancerosas e com isso matá-las. A precisão teria de ser "cirúrgica", como -teoricamente- são as armas ditas inteligentes. O meio encontrado foi construir um "míssil" capaz de levar a aliinase até a célula a ser atacada e, depois, injetar a aliína. Ao se encontrarem na superfície da célula, formariam a matadora alicina.
O míssil é um anticorpo projetado para reconhecer apenas um alvo, receptores que ficam superfície da célula do tumor. Esses receptores são encontrados só em células cancerosas, por isso a combinação aliinase-aliína nunca se forma em outro ponto do organismo.
O estudo foi feito por Aharon Rabinkov, Talia Miron, Marina Mironchick, David Mirelman e Meir Wilchek. Foi publicado na revista especializada "Molecular Cancer Therapeutics".
O método foi testado em camundongos que tinham tumores no estômago, mas tem potencial para ser usado contra outros tumores, ou mesmo micróbios. Basta que tenham receptores específicos que sirvam de alvo.
Para Mirelman, a terapia poderia servir até nos casos graves em que células do tumor migrem para outros pontos do organismo, a chamada metástase. Mesmo que os médicos não consigam determinar para quais pontos as células metastáticas migraram, "a combinação anticorpo-aliinase-aliína as caçaria e destruiria em qualquer lugar do corpo", diz ele.
Os pesquisadores pretendem agora fazer novos experimentos para investigar o potencial da terapia, examinando diversos outros tipos de tumores e as moléculas na superfície de suas células.


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