São Paulo, sexta-feira, 30 de maio de 2008

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Decisão do Supremo já chega caduca

MARCELO LEITE
COLUNISTA DA FOLHA

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) a favor da já ultra-restritiva Lei de Biossegurança, no que toca à pesquisa com embriões, chega com atraso. Parece que está no DNA do debate público nacional: começa tarde, demora mais do que deveria -basta acompanhar os intermináveis votos no STF- e, quando, termina, está superado pelos fatos.
A própria Lei nº 11.105/ 2005 demorou. Vinha modificar a anterior (8.974/ 1995), que caducou rápido por proibir qualquer pesquisa com células-tronco embrionárias humanas, ao vedar "produção, armazenamento ou manipulação de embriões destinados a servir como material biológico disponível".
Algo de similar ocorre com o artigo 5º da Lei de Biossegurança, agora referendado pelo STF. Ele se limita a autorizar o uso dos raros embriões que satisfaçam uma de duas condições -ser inviável ou estar congelado há mais de três anos. Isso já atrapalha a pesquisa, diante das leis de países mais avançados.
O Reino Unido já aprovou até embriões híbridos, produto da fusão de óvulos de vaca com células humanas. Só para pesquisa, claro, e para evitar desperdício de óvulos humanos.
Há mais, porém, contra a expectativa de vida da lei.
O ministro Carlos Alberto Direito, cujo pedido de vista garantiu mais atraso, mencionou a possibilidade de obter células-tronco de um embrião, que permaneceria íntegro. A ministra Ellen Gracie Northfleet ressalvou, corretamente, que um único estudo -de Robert Lanza, controverso e não replicado- obteve isso.
Existe ainda a criação de células-tronco com o potencial de embrionárias, mas a partir de tecido adulto. Pesquisa com as próprias células-tronco adultas, além disso, prescindem da destruição de embriões e avançam em aplicações terapêuticas.
Em resumo: conseguiu-se enfim autorizar o que dez anos atrás parecia promissor, mas em raras situações, hoje, e com perspectivas cada vez mais estreitas. Mesmo quem discorda de dar carta branca aos cientistas pode diagnosticar aí uma incapacidade crônica de decidir o que fazer em sincronia com a própria época.


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