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Folhas da mata atlântica abrigam zôo microscópico
Cada tipo de planta do ecossistema pode ter quase 700 espécies de bactéria
Estimativa sugere que 97%
desses micróbios ainda não
foram descritos pela ciência;
floresta poderia contar com
diversidade igual à do mar
REINALDO JOSÉ LOPES
DA REPORTAGEM LOCAL
Ao que tudo indica, a biosfera, como é conhecido o conjunto dos seres vivos da Terra, tem
uma região altamente subestimada, a filosfera. Explica-se: o
nome é dado à superfície das
folhas das plantas, e um grupo
de cientistas no Brasil e nos
EUA acaba de mostrar que três
espécies de árvore da mata
atlântica provavelmente abrigam, cada uma, centenas e centenas de tipos de bactéria.
Nem o mais experiente dos
biólogos conseguiria citar de
nome todos os habitantes desse
zoológico, por uma razão muito
simples. Estima-se que 97%
dessas espécies seja completamente desconhecida da ciência. Se você soltou um sonoro
"humpf!" diante da informação, é bom considerar o que ela
implica. Se cada uma das 20 mil
espécies de planta da mata
atlântica abrigar um bestiário
parecido em suas folhas, a soma
total de tipos de bactéria no
ecossistema ficaria entre 2 milhões e 13 milhões. O oceano inteiro da Terra tem "só" 2 milhões de espécies, segundo as
estimativas mais recentes.
Conservador
"Mesmo levando em conta
todas as incertezas, a gente provavelmente está sendo conservador nessa estimativa. A diversidade é muito grande", declarou à Folha Marcio Lambais, da USP de Piracicaba. Ele
é um dos autores do estudo,
publicado na edição de hoje da
revista americana "Science"
(www.sciencemag.org).
Lambais explica que o mapeamento das bactérias da filosfera de ecossistemas naturais, como a mata atlântica,
ainda está por ser feito. "A
maioria dos estudos até agora
enfocaram plantas cultivadas,
como a cevada e o trigo."
O problema básico a ser enfrentado num levantamento
desses é que entre 95% e 99%
das bactérias não "aceitam" ser
cultivadas em laboratório, dificultando sua identificação. Por
isso, Lambais e seus colegas Ricardo Ribeiro Rodrigues, também da USP de Piracicaba, e
David Crowley, da Universidade da Califórnia em Riverside,
removeram as bactérias das espécies de árvore e extraíram o
DNA delas em bloco.
Depois, partiram para uma
análise mais refinada, "lendo"
fragmentos de DNA correspondentes a um gene usado para estimar o grau de parentesco
entre espécies bacterianas.
Com base nisso, eles estimam
que cada tipo de planta tenha
em suas folhas entre 95 e 671
bactérias diferentes. O importante é que apenas 0,5% dessas
espécies é comum às três plantas. É como se a filosfera de cada uma delas fosse um ambiente em si, com diferentes desafios e oportunidades.
As implicações práticas do
trabalho estão longe de ser microscópicas. "Essa diversidade
genética também deve corresponder a uma diversidade metabólica", diz Lambais. Entre
tantos microrganismos desconhecidos, é grande a possibilidade de haver muitas substâncias e processos de interesse
médico, industrial ou agrícola.
Tanto a análise de DNA quanto
o cultivo em laboratório dos
micróbios deve revelar várias
surpresas desse tipo.
O trabalho integra o Programa Biota, projeto de mapeamento da biodiversidade financiado pela Fapesp (Fundação
de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo).
Leia mais sobre diversidade de bactérias www.microbeworld.org
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