São Paulo, terça-feira, 30 de junho de 2009

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Sapo não esguicha veneno de propósito, diz cientista

Estudo anatômico mostra que glândulas com toxina reagem a pressão externa

Segundo grupo do Instituto Butantan, defesa desse grupo de anfíbios é passiva e descarga de veneno no olho da vítima é crença falsa

Carlos Jared
Cientista espreme glândula de veneno, disparando a toxina

NARA LYA CABRAL
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Ao contrário do que prega a crença popular, os sapos não conseguem esguichar seu veneno por vontade própria quando se sentem ameaçados. As glândulas de defesa desses animais só reagem se forem pressionadas -pela mordida de um predador, por exemplo. A teoria acaba de ser provada por cientistas do Instituto Butantan, da USP, e da Universidade de Düsseldorf, na Alemanha.
Carlos Jared, do Butantan, liderou a pesquisa e destaca que, embora o comportamento de defesa dos sapos e sua toxicidade sejam conhecidos pela sabedoria popular, existe muita desinformação sobre o assunto. "É falsa a crença que diz que o sapo esguicha o seu veneno mirando no olho da vítima."
No estudo, publicado na última edição do periódico "Toxicon", os cientistas analisaram o sapo-cururu (Rhinella jimi), uma das espécies mais comuns no Brasil. Jared diz acreditar que a descarga de veneno seja similar para todos os sapos.
Esse grupo, o dos bufonídeos, apresenta o que se chama de "defesa passiva"; seu veneno só é liberado por pressão externa sobre as chamadas glândulas parotoides, localizadas no dorso. Os sapos não têm músculos capazes de esguichá-lo.

Deslocamento
Embora glândulas de veneno estejam presentes em todos os anfíbios, as parotoides apresentam características peculiares. Segundo Jared, durante a história evolutiva dos sapos, essas glândulas sofreram modificações e agregaram-se na região próxima à cabeça, local estrategicamente posicionado para a mordida dos predadores.
Os pesquisadores mostraram que as parotoides são formadas por alvéolos de colágeno semelhantes a favos de mel. Cada um pode ser considerado uma glândula em forma de garrafa, que produz veneno e possui, na parte mais alta, um poro fechado por um "plug" de pele.
Quando um predador abocanha um sapo, mordendo as parotoides, ele pressiona as glândulas e rompe os plugs, recebendo na boca jatos de veneno.
Tudo o que o sapo pode fazer, com o intuito de se defender, é inflar os pulmões e expor as parotoides. Esse comportamento de defesa tem dupla utilidade: faz com que as glândulas fiquem no máximo de turgidez e simula um tamanho de corpo maior. O bicho também pode esvaziar a bexiga sobre o agressor, mas a urina não é tóxica.
Mesmo se o sapo atacado for morto, a espécie ainda se beneficia da adaptação: o predador geralmente passa muito mal e pode associar os efeitos nocivos do veneno ao bicho.
Frequentemente é o predador que não sobrevive. "O veneno é extremamente tóxico, especialmente para o coração", diz Jared. O contato com a mucosa da boca, de um filhote de cachorro, por exemplo, frequentemente é fatal.
Jared aponta, no entanto, que observações em campo mostraram que os quatis conseguem contornar a ameaça. Eles esfregam a presa contra o solo e, frequentemente, desprezam a região próxima à cabeça e boa parte da pele.
Pesquisadores do Instituto Butantan, liderados por Daniel Pimenta, do mesmo grupo de Jared, já descobriram moléculas com propriedades antibióticas no veneno desses animais.
"Já se pode prever o seu grande potencial para a medicina", afirma Jared.


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