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CIÊNCIA
Sigilo de teste de vacina anti-Aids é quebrado
DANIELA SANDLER
da Reportagem Local
Uma vacina anti-HIV a ser testada em humanos pela empresa
farmacêutica norte-americana
Merck no final deste ano, que vinha sendo mantida em sigilo, veio
a público ontem por meio de jornais, revistas e redes de notícias
dos EUA, após ser citada em um
artigo da revista "Science".
A excitação dos meios de comunicação em torno da nova vacina
contrasta com a reticência da
Merck, que não fez anúncio oficial (segundo a empresa, a informação "vazou") e ainda envolve a
vacina em mistério.
Por que, então, tanta animação,
se várias vacinas vêm sendo testadas desde o começo dos anos 90
-boa parte delas sem resultados
promissores?
"Talvez porque a Merck tenha
passado muito tempo afastada da
pesquisa de vacinas anti-HIV e
agora tenha se voltado novamente para isso", disse à Folha, por telefone, o cientista Emilio Emini, o
mais alto executivo do programa
de vacinas da empresa.
"A notícia importante é que
uma indústria não brinca em serviço", disse David Lewi, infectologista da Universidade Federal de
São Paulo. "As vacinas estão meio
abandonadas, restritas às universidades e à comunidade científica.
A empresa não vai fazer investimentos para perder dinheiro."
Há motivos para acreditar que a
vacina seja promissora. Como
parte do procedimento científico
usual, a empresa só decidiu investir nos testes em humanos após
ter feito testes com animais
-macacos, segundo a revista
"Businessweek".
É possível presumir, portanto,
que esses testes foram bem-sucedidos? Segundo uma porta-voz da
Merck norte-americana, sim.
Nem ela nem Emini, no entanto, divulgam seus resultados, que
ainda não foram publicados em
revistas científicas.
"Não queremos criar expectativas indevidas", disse Emini. "Ainda é muito cedo."
De fato, também há motivos para cautela. "Muitas pesquisas de
vacinas "morrem na praia". O HIV
sofre muitas mutações. Por isso, é
difícil desenvolver anticorpos que
funcionem, que neutralizem o vírus", disse Lewi.
Muitas das vacinas testadas funcionaram em vírus reproduzidos
em laboratório -e falharam em
vírus retirados de seres humanos.
Segundo Jon Cohen, autor do
artigo da "Science" (um panorama das pesquisas de vacinas anti-HIV), a busca por vacinas estagnou nos últimos cinco anos, pelo
insucesso de testes prévios.
Emini limita-se a dizer que a vacina da Merck -aliás, vacinas,
pois são duas- "tem uma abordagem nova, que ainda não pode
ser revelada".
Ela é feita com pedaços do material genético (DNA) do vírus, inseridos no corpo para estimular a
produção de células de defesa conhecidas como "supressoras".
Emini e a porta-voz da Merck
disseram que os testes com humanos vão começar no final deste
ano. Deverão verificar a segurança da vacina e a sua capacidade de
provocar, em humanos, as mesmas respostas imunológicas observadas em animais.
Os testes serão feitos em diversos países do mundo, com um pequeno número de voluntários
saudáveis, sem HIV. A duração
prevista é de um ano a um ano e
meio. Só depois será investigada
sua eficácia em mais participantes
-e os cientistas esperam ter de
fazer vários ajustes.
Mesmo que tudo dê certo, a vacina anti-HIV ainda demora.
Dez anos? "Eu não ficaria surpreso se levasse todo esse tempo",
disse Emini. "Mas pode ser mais.
Ou menos."
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