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'Inação está levando o planeta ao limite'

Cientista sueco diz que humanidade já ultrapassou vários limiares importantes para o bom funcionamento da Terra

Para pesquisador, falta ouvir a ciência durante conferências da ONU; cúpula do Rio 'não refletiu essa urgência'

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O hidrólogo sueco Johan Rockström em Estocolmo
O hidrólogo sueco Johan Rockström em Estocolmo

CLAUDIO ANGELO
ENVIADO ESPECIAL AO RIO

O hidrólogo sueco Johan Rockström chegou ao Rio de Janeiro na semana retrasada com uma certeza: a Terra está no limiar de um futuro no qual o risco de colapso ambiental é inédito. E saiu na semana passada com outra: os governos não escutam.

Diretor do Centro de Resiliência de Estocolmo, Rockström tornou-se uma espécie de celebridade na academia ao propor, em 2009, o conceito de "espaço de operação seguro" para a humanidade.

O grupo de 28 cientistas liderado por ele mostrou, num estudo seminal no periódico "Nature", que a civilização já ultrapassou três de nove barreiras planetárias cujo rompimento pode levar a pontos de virada no sistema terrestre -e a possíveis catástrofes. A pedido do secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, Rockström coordenou um grupo de Prêmios Nobel que produziu uma carta com recomendações sobre sustentabilidade global para dar subsídios às decisões da Rio+20, conferência ambiental que terminou nesta sexta no Rio.

BARRADOS NO BAILE

Dois dos conceitos-chave da carta, porém, ficaram de fora da declaração final da conferência, "O Futuro que Queremos": o empoderamento das mulheres e o próprio reconhecimento de que limites planetários existem.

O que, para o pesquisador sueco, é uma má notícia, já que o avanço da ciência anda mostrando que a transgressão desses limites é ainda mais séria do que seu grupo imaginava em 2009.

Na pesquisa original, os três limites já transpostos eram os de biodiversidade, mudança climática e ciclo do nitrogênio (ligado ao uso excessivo de fertilizantes, entre outras mazelas ambientais).

"O que aconteceu desde então é que nós aprendemos mais sobre o limite do fósforo e descobrimos que já o transgredimos", declarou Rockström à Folha no Riocentro, um dos "palcos" da Rio+20. "Não é uma mensagem que muita gente goste de ouvir, mas estamos chegando ao teto do que o planeta é capaz de suportar sem gerar nenhuma surpresa."

O hidrólogo compara o sistema planetário a uma "mãe muito compreensiva" que aceitou ser usada como "lata de lixo" sem grandes problemas até recentemente.

"Hoje nós vemos que essa era chegou ao fim. E nós não sabíamos disso em 2005, não sabíamos disso em 2002, certamente não sabíamos disso em 1992. É uma situação tão nova que nós perdemos qualquer liberdade", afirma.

CADÊ A CIÊNCIA?

Rockström também critica o que vê como marginalização da ciência no debate político das conferências ambientais da ONU.

"A ciência precisa entrar nas negociações, hoje ela está fora", diz. Um exemplo seria o resultado da conferência do clima de Durban (África do Sul), que deixou para 2020 a redução de emissões de gases causadores do efeito estufa, como o CO2.

"Do ponto de vista científico, é uma irresponsabilidade total. Se você adiar a ação para 2020, o ritmo da redução terá de ser de 7% a 8% por ano. Mas fazer 200 países reduzirem emissões de 7% a 8% por ano não é viável, não consigo enxergar a revolução tecnológica que permitiria que isso acontecesse."

Por tudo isso, ele afirma que a Rio+20 "não nos leva muito longe" para resolver o problema. "O texto não reflete a urgência que enfrentamos. É uma uma enorme encruzilhada para a humanidade. Se não acertarmos agora, será tarde demais: a Rio+30 não vai resolver. Então há razão para preocupação."

Ele também fez críticas à imprensa por dar espaço aos poucos cientistas que minimizam a gravidade da situação. "Os jornalistas simplesmente não conseguem distinguir o que 99% dos cientistas dizem do que diz um punhado de homens provocadores, excêntricos e idosos."

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