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Depoimento gastronomia nos EUA
Cardápio desperta o desejo de que houvesse botão de pausa na vida real
Grant Achatz, chef do sétimo melhor do mundo, valoriza carnes de caça no Next, em Chicago
Dizem que o chef Grant Achatz, comandante do Alinea de Chicago (EUA), o sétimo melhor do mundo segundo a revista inglesa "Restaurant", cria sinfonias em seus menus-degustação. Seu atual menu do Next, restaurante de cardápio sazonal em Chicago, confirma a fama.
Recebi do "Comida" a missão de experimentar o menu "The Hunt" (a caçada), em cartaz até outubro, que explora o universo da caça.
Para comer no Next, é necessário comprar ingressos antecipados. Eles são vendidos ao início de cada temporada e, apesar do preço alto (US$ 125 pela comida, cerca de R$ 250), esgotam rapidamente, e mesas extras passam a ser oferecidas on-line.
Ao fim de uma semana, e após 50 minutos de cliques, consegui um lugar.
Na hora certa, às 18h30, cheguei ao Next, sem placas. O ambiente é sóbrio -uma pele de animal adorna a mesa e não há som ambiente-, mas agitado por um compenetrado batalhão de garçons. O maître diz "divirta-se".
Em "The Hunt", o espetáculo começa quando uma caixinha de joias de vidro e armação dourada aterrissa na mesa. Dentro, sobre cama de alecrim e tomilho, repousam cogumelos selvagens.
O vinho, um chardonnay não filtrado esloveno, é a primeira bebida de sete da harmonização com alcoólicos "standard" (US$ 78). O cogumelo, o primeiro de uma série de 13 pratos.
O garçom explica que a próxima etapa remete à necessidade de preservação dos alimentos. São servidos truta defumada, rillette de walleye (peixe da região dos Grandes Lagos dos EUA), picles de nabo e finas torradas amanteigadas de pão preto.
A seguir, duas garrafinhas de metal trazem o armagnac que acompanha um tronco de árvore. Este serve de suporte para cinco itens de charcutaria: patê de coelho, charque de alce, salame de javali envelhecido por 45 dias, tartare de coração de veado e linguiça de sangue.
O jantar, aos poucos, deixa as referências mais rústicas de lado e passa a ser uma sofisticada celebração do inverno. O primeiro sinal disso é a chegada de um castiçal.
Nesse momento, é servido um esturjão ao molho cremoso de seu próprio caviar e manteiga. O prato desperta o desejo de que, na vida real, existisse um botão de pausa.
Minutos e alguns medalhões de galinhola escocesa depois, é chegada a hora em que o comensal se sente o caçador. Com uma apresentação de tirar o fôlego, é servido um borracho, espécie de pombo jovem, com 100% de aproveitamento: magret, confit, cabeça e miúdos.
A etapa das sobremesas começa dois pratos e um uísque depois e traz uma saudade antecipada. A primeira é fantástica -crème brûlée de tutano, servido no osso, de fazer chorar. A segunda, decepcionante -mingau de cevada excessivamente suave.
Por sorte, junto do café da Nicarágua, há um último sabor para ressuscitar o ânimo: caramelo de "maple" ainda quente, a ser enrolado em um palito de madeira em cima de um prato de gelo picado -a neve.