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Nina Horta

Medo do Drauzio Varella

Chorem! O doutor deu a última estocada no gosto que não se repete! Agora, o fogão a lenha mata!

Será que andam escrevendo mais do que é preciso? Qual deverá ser nossa atitude em relação aos milhares de livros que nos interessam? Ou estamos interessadas em mais assuntos do que deveríamos estar?

Muita gente esperta analisando o mundo, descobrindo teorias, falando sobre internet, consumo, China, comida, teoria literária, crítica de restaurantes, filósofos que deitam sabedoria sobre tudo e todos.

Vocês, quando gostam de um autor, precisam ler absolutamente tudo o que escreveu? Com os livros de cozinha acaba ficando complicado.

Com o tempo, os livros do mesmo autor vão ficando repetitivos. Geralmente, ele tem um método, um jeito próprio de cozinhar que se espelha no seu melhor livro.

Os outros vão carregar novidades em matéria de ingredientes, mas o estilo de mexer com o novo macarrão será o mesmo com o que tratava o miojo. Mais uma gotinha de molho de soja aqui, um amido diferente para engrossar, e a cara da comida é a mesma, o estilo continua a ser do homem.

A Rocco acabou de publicar a tradução de um livro da Gabrielle Hamilton. Fiz a resenha no blog. O livro é excelente, sem receitas, muitíssimo bem escrito. Qualquer dia ela cede aos editores e faz uma edição de luxo com suas receitas e a gente compra correndo porque o primeiro era tão bom.

Mas não são as receitas que são boas, é toda uma atitude frente ao ingrediente, o livro de receitas é sempre um naco explicativo, prático, do que o autor pensa sobre o enorme assunto que é a comida.

As pequenas coisas que as receitas não contam são justamente as que valem. Pensem num livro de receitas brasileiro lido por um estrangeiro. Tem de tudo, salada de tomates com alface, arroz, feijão, bife, batata frita. Mas, como e quando comemos isso, quem conta que é tudo misturado no mesmo prato, inclusive a salada? E que aquele arroz com feijão de todo santo dia, chova ou faça sol... E a farinha? E a pimenta? E a banana crua misturada?

Elizabeth David, cozinheira inglesa dona de uma prosa sem defeito, escrevia receitas assim, só por cima. E você acabava de ler um livro dela e se precipitava para o fogão.

Para mim são esses os livros que valem, os que inspiram, que dão ânimo, que te tiram do torpor das coisas velhas, acendem a curiosidade com o tloc de um bico de gás e fritamos um ovo de gema amarela e beiradas torradas.

Por falar em gás, em emoção, chorem! Drauzio Varella deu a última estocada no sonho maior! No cheiro maior! Na saudade maior, no gosto que não se repete! E eu, que tinha medo dele, sempre alertando para o que não pode, fugia como o diabo da cruz de suas proibições. Descobri o segredo que guardava sem ter coragem de confessar. O fogão a lenha mata!

A Organização Mundial de Saúde considera o fogão a lenha o fator ambiental responsável pelo maior número de mortes do mundo inteiro! Doença pulmonar obstrutiva e ou problemas cardiovasculares...

A ilustração da matéria do Drauzio é um fogão de lenha sendo usado por uma caveira. Vat-en-Satan! Podíamos ter ficado sem essa! Quem manda ficar lendo tudo que vê pela frente? Dá nisso....

ninahorta@uol.com.br

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